UNIDADE
I. NOÇÕES GERAIS
I.
Apresentação da Matéria
Como definir o regime jurídico aplicável?
Identificar a relação jurídica
Contratos
de consumo
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Contrato
civil
|
Contrato
empresarial
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Fornecedor / Consumidor
Lei 8.078/90 (C.D.C)
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Código Civil
Parte Geral + Especial
(Arts 421 850)
+ Leis Especiais (ex: Lei
8.245/91)
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1. Conceito de
Consumidor
Exemplos:
Fábrica de calçados (couro/produtos de
limpeza)
Taxista
Cabeleireira que adquire secador
Academia que adquire máquinas.
Caminhoneiro que adquire veículo para
fazer fretes.
1.1. Teoria
Finalista
Consumidor é aquele que retira
definitivamente de circulação o produto ou serviço do mercado. O consumidor adquire produto ou utiliza
serviço para suprir necessidade ou satisfação eminentemente pessoal ou privada,
e não para o desenvolvimento de uma outra atividade de cunho empresarial ou
profissional.
Dessa forma, a aquisição ou uso do bem
ou serviço para o exercício de atividade econômica, civil ou empresarial,
descaracteriza o requisito essencial à formação da relação de consumo. Esta
corrente sustenta que o objetivo do CDC é proteger aqueles que realmente
precisam. Adota o conceito de consumidor como “destinatário econômico do
produto ou serviço.”
Exemplo:
Empresa
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Produto Adquirido
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Enquadramento
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Fábrica de Calçados
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Produto de Limpeza
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È consumidor, pois retira o produto ou
serviço da cadeia de consumo (esses produtos não são utilizados diretamente
no processo produtivo da empresa)
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Fábrica de Calçados
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Couro
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Não é consumidor, pois está adquirindo
matéria prima para o incremento de sua atividade.
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Outros
Exemplos:
Exemplos: móveis e utensílios que
compõem o estabelecimento, programas de computador utilizados em escritório....
(isso não é destinação final). Tais produtos ingressam na atividade econômica,
caracterizando sua utilização como instrumento
do ciclo produtivo de outros bens ou serviços.
1.2. Doutrina
Maximalista
Para a doutrina maximalista, não interesse o uso particular ou
profissional do bem. Com efeito, como o próprio nome sugere, a teoria
maximalista é bem mais ampla e só não considera consumidor “aquele que participa diretamente do processo de produção,
transformação, montagem, beneficiamento ou revenda.” Consideram que a
definição do art. 2º é puramente objetiva, não importando se a pessoa física ou
jurídica tem, ou não, fim de lucro quando adquire um produto ou utiliza um
serviço.
Assim, para a doutrina maximalista, o
consumidor é o destinatário fático do produto. É aquele que retira da cadeia de
produção (produção, transformação, montagem, beneficiamento ou revenda).
Exemplos: fábrica de celulose que compra
carros para o transporte de visitantes, escritório que compra computadores para
a redação de peças processuais...
Na teoria maximalista (objetiva),
“destinatário final é o destinatário
fático do produto ou serviço, ou seja, é aquele que adquire o produto ou
serviço, retirando-o do mercado de consumo. [...] não importa a destinação
econômica que a PF ou PJ pretende dar ao produto ou serviço. Basta a retirada
do bem de consumo da cadeia de produção para que se identifique o consumidor...
é irrelevante se o produto ou serviço será revendido, empregado
profissionalmente ou utilizado para fim pessoal ou familiar.
Nessa linha, considera-se consumidor,
por exemplo, o empresário que adquire uma máquina nova para empregá-la na
produção têxtil de sua fábrica.
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1.3. Doutrina
Finalista Temperada
Esta corrente defende que também é
considerado destinatário final todo aquele que, embora tenha adquirido ou
utilizado produto e serviço para fins profissionais ou econômicos, seja
considerado vulnerável dentro daquela relação. No caso do taxista que adquire
um veículo para sua atividade. É óbvio que há o uso econômico do produto, mas o
taxista, por ser considerado vulnerável em relação à fabricante, é considerado
consumidor.
Ainda no exemplo do táxi, se fosse
adotada a teoria finalista, o taxista não seria considerado consumidor.
è Quadro Conclusivo
Teoria
maximalista (objetiva)
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Consumidor é a PF ou PJ que adquire ou
utiliza o produto ou serviço, retirando-o da cadeia de produção (destinatário
fático), independentemente da destinação que é dada ao bem.
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Teoria
Finalista (subjetiva)
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Consumidor é a PF ou PJ que adquire ou
utiliza produto ou serviço (destinatário fático) para fim pessoal, privado ou
familiar, em revendê-lo ou incrementá-lo em sua atividade profissional
(destinatário econômico)
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Teoria
Finalista Aprofundada
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Consumidor, em regra, é o destinatário
fático e econômico do bem. Excepcionalmente, também poderá ser considerado
consumidor a PJ ou PJ que, embora faça uso do produto ou serviço para fim
profissional, comprove, em concreto, sua condição de vulnerabilidade.
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II.
Análise
Estrutural do Contrato
1.
Conceito de
Contrato
O
objetivo deste capítulo é o de identificar o contrato como uma categoria
jurídica para diferenciá-lo de categorias afins.
Numa
visão clássica, estrutural e sucinta, o contrato é o “acordo de vontades para o
fim de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos” (BEVILAQUA apud GONÇALVES, 2012, p. 22). Ou, como
prefere Caio Mario: “acordo de vontades com a finalidade de produzir efeitos
jurídicos”[1]
Para
se chegar a este conceito é preciso relembrar, ainda que sucintamente, do que
foi estudado na parte geral sobre os negócios jurídicos. Em resumo, como foi
visto, fato jurídico é todo acontecimento que produz efeitos jurídicos
(criação, alteração ou extinção de relações jurídicas). Esta é a categoria
geral, da qual emergem as demais.
Do
fato jurídico surgem outras duas categorias: o fato jurídico em sentido estrito, que é aquele evento produzido por
circunstâncias alheias à vontade do homem, que produzem efeitos jurídicos, como
as nefastas conseqüências provocadas por
uma longa estiagem (período de seca), como o racionamento de energia (O
Fórum Econômico Mundial de 2015 apontou a seca como o principal risco de uma crise
mundial[2]), ou
o decurso do tempo, que extingue a pretensão do credor de uma obrigação.
A
outra categoria é a do ato jurídico,
que compreende aqueles eventos resultantes da manifestação da vontade humana e
que também produzem efeitos jurídicos aptos a criar, modificar ou extinguir
relações jurídicas.
Mas
antes de entrar nos exemplos, é preciso alertar que existem duas categorias de
atos jurídicos, os negócios jurídicos unilaterais, os bilaterais e os
plurilaterais. Devido a importância da distinção entre as mencionadas
categorias, segue-se um tópico à parte para abordá-los.
1.1. Negócios
Jurídico Unilateral, Bilateral e Plurilateral
Embora essas
três categorias tenham em comum o fato de surgirem da vontade humana, elas se
distinguem quanto ao momento de sua formação, ou seja, elas surgem da vontade
humana, mas a produção de seus efeitos pode ocorrer em momentos distintos.
Neste sentido, o
negócio jurídico unilateral é aquele
que se aperfeiçoa (que se forma) com a manifestação de vontade de apenas uma
das partes, do qual são os mais nítidos exemplos o testamento e a promessa de recompensa.
Já o negócio
jurídico bilateral é aquele que depende, para a sua formação, do encontro de
vontade de duas partes, enquanto o negócio jurídico plurilateral, por sua vez,
envolve a manifestação de mais de duas vontades. Os contratos são exemplos por
excelência de negócio jurídico bilateral, mas nada impede que existam contratos
formados pelo encontro de mais de duas vontades, como é o caso do contrato de
uma sociedade, que é classificado pela doutrina italiana como contrato
plurilateral.
A diferença,
portanto, está no número de vontades necessárias à formação do ato jurídico. O
contrato é um negócio jurídico pelo menos bilateral.
A doação, por
exemplo, foi incluída pelo Código Civil como uma espécie de contrato. Isso
significa que o beneficiário do ato, o chamado “donatário”, tem que manifestar
sua vontade para dizer se aceita ou não a liberalidade oferecida pelo doador.
Enquanto esta vontade não for manifestada, não se forma o contrato de
doação.
1.2.
O Autocontrato
ou Contrato Consigo Mesmo (mandato em causa própria)
Alguém poderia
celebrar um autocontrato ou contrato consigo mesmo? Esta pergunta realmente não
faz sentido porque não tem lógica! Afinal, não posso comprar algo que já é meu,
assim como não posso contratar um serviço que eu mesmo vou prestar.
Portanto, a
atenção que se deve ter neste aspecto é que a doutrina criou esta expressão (“autocontrato”)
para definir aquele negócio em que o
representante, no seu próprio interesse, celebra consigo mesmo.
Por exemplo: A
outorga uma procuração a B para que este realize a venda deste bem. A pergunta
que se faz é: B, mesmo sendo mandatário de A, pode comprar o imóvel? A resposta
é afirmativa, desde que o representante tenha poderes específicos para tanto.
A lei exige que
esta possibilidade fique expressa no contrato para evitar possíveis “conflitos
de interesses”, já que enquanto o representado/mandante quer um preço maior, o
comprador, que no caso é o representante, quer um preço menor na compra do
imóvel.
Mas se, mesmo
sem poderes expressos, o representante vier a concluir o negócio, comprando o
imóvel para si, o representado pode anular o negócio e diante da omissão legal
a respeito do prazo para a anulação do contrato, aplica-se a regra geral
prevista no art. 179 do Código Civil, de forma que o representado terá até dois
anos para propor a ação anulatória.
Observa-se, no
entanto, que não é correto dizer que houve um autocontrato ou contrato consigo
mesmo. O que há, aproveitando do exemplo dado, é um contrato entre A e B, com a
diferença que A manifestou sua vontade por intermédio de seu procurador B.
Apesar disso, o contrato tem duas partes compostas por pessoas distintas. O
autocontrato é na verdade o mandato em causa própria, previsto no art. 685 do
Código Civil.
Sobre o tal contrato
consigo mesmo, conferir o disposto no art. 117, 179 e 685 do Código Civil:
Art.
117. Salvo se o permitir a lei ou o representado, é anulável o negócio jurídico
que o representante, no seu interesse ou por conta de outrem, celebrar consigo
mesmo.
Art.
179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer
prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da
conclusão do ato.
Art.
685. Conferido o mandato com a cláusula "em causa própria", a sua
revogação não terá eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das
partes, ficando o mandatário dispensado de prestar contas, e podendo transferir
para si os bens móveis ou imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades
legais.
2.
Requisitos de
Validade do Contrato
De acordo com
Carlos Roberto Gonçalves (2012), os requisitos dos contratos podem ser
divididos em dois grandes grupos: requisitos subjetivos e objetivos. São da
primeira modalidade a capacidade civil e o consentimento livre e expresso do
agente e do segundo o objeto lícito, possível, determinado ou determinável e a
forma prescrita ou não defesa em lei.
Em síntese:
Requisitos Subjetivos
|
Requisitos Objetivos
|
||
Capacidade Civil
|
Consentimento Livre e Expresso do
Agente.
|
Objeto, lícito, possível, determinado
ou determinável
|
Forma prescrita ou não defesa em lei.
|
2.1.
Requisitos
Subjetivos
2.1.1.
Capacidade Civil
do agente
O critério para
se reconhecer a capacidade civil da pessoa natural no direito brasileiro é o
discernimento, que é presumido quando atingida a maioridade, aos 18 anos, mas
que pode ser afastado por meio de um processo de interdição no qual fique
comprovada a existência de problemas mentais.
2.1.1.1.
Capacidade
Negocial da Pessoa Natural
Muito embora a
lei exija a capacidade civil plena
para que o agente possa celebrar de maneira livre e pessoal a maioria dos tipos
de contratos, ela reconhece, em situações excepcionais, capacidade negocial para
a celebração de certos contratos às pessoas com 16 anos completos, como ocorre
no contrato de mandato, em que o
mandatário pode ser menor entre 16 e 18 anos. (art. 666)
Pode-se lembrar,
também, do contrato de transporte em que esta capacidade é conferida até mesmo
para menores com idade abaixo de 16 anos (crianças e adolescentes que se
deslocam em coletivos urbanos dentro do município onde residem).
O interessante é o contrato
de transporte as regras variam dependendo da condição do passageiro: se criança
ou adolescente.
De acordo com o art. 83 do
ECA, a criança só pode se deslocar para outra comarca, devidamente acompanhada
dos pais ou responsáveis ou mediante ordem judicial.
As
exceções estão contempladas no §1º do art. 83:
§ 1º
A autorização não será exigida quando:
a)
tratar-se de comarca contígua à da residência da criança, se na mesma unidade
da Federação, ou incluída na mesma região metropolitana;
b) a
criança estiver acompanhada:
1) de
ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado documentalmente
o parentesco;
2) de
pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou responsável.
Assim, como o artigo 83 só se
refere às crianças[3], um adolescente de 13 anos
poderá celebrar validamente um contrato de transporte, inclusive para fora da comarca onde reside. Trata-se de uma
hipótese que excepciona o requisito da capacidade civil para a prática de
negócios jurídicos. A lei reconhece que o adolescente tem discernimento em tais
casos.
Já se a viagem é para o
exterior, a situação é mais restrita. O art. 84 do ECA exige a presença de
ambos os pais ou responsável. Se a viagem for feita por apenas um dos pais,
exige-se a autorização expressa do outro por documento com firma reconhecida.
Fora dessas hipóteses, é necessária autorização judicial.
2.1.1.2. Eficácia nos Contratos Firmados por Incapazes.
a) Ninguém pode se beneficiar da própria Torpeza
Em
certas circunstâncias o ordenamento termina
por convalidar contratos celebrados por incapazes. O sistema empresa
validade e eficácia a contratos que, em linha de princípio, seriam inválidos.
Veja, a título
de exemplo, a situação prevista no art. 180 do Código civil, sobre o menor
entre 16 e 18 que ocultou maliciosamente a sua idade ou afirmou expressamente
ser capaz. Como se pode notar, o menor não pode eximir-se de cumprir a
obrigação se agiu desta maneira.
O sistema, que
está orientado à proteção do incapaz, acaba por recusar-lhe a tutela em tais
casos, dando prestígio à boa fé e a confiança nas relações contratuais.
Protege-se o tráfico jurídico em detrimento do menor entre 16 e 18 anos. No fim
das contas, a regra é corolário do princípio geral que impede que a parte possa
querer tirar algum benefício da própria torpeza.
Vejamos a
redação do art. 180:
Art.
180. O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para eximir-se de uma obrigação,
invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte,
ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior.
b)
Mútuo feito a
Menor
Mas se o sistema
pune o menor entre 16 e 18 anos que agiu de maneira maliciosa, acaba por fazê-lo
em caráter excepcional, já que o sistema é todo voltado à proteção dos
incapazes.
Um bom exemplo
desta proteção sistêmica está na regra que impede o mutuante de reaver aquilo
que emprestou ao menor. Como se verá, mútuo é uma espécie de empréstimo, que
tem por objeto bens fungíveis, como dinheiro e produtos agrícolas, que podem
ser substituídos por outros da mesma espécie, quantidade e qualidade.
Assim, se eu
empresto certa quantia em dinheiro a um menor, não poderei reaver o valor,
muito menos os juros que foram combinados na negociação.
Dizem que esta
regra foi elaborada no Direito Romano, inspirada no caso do senador chamado
Macedo, que foi morto pelo próprio filho menor, que executou o ato para pagar o
empréstimo tomado com terceiros. O filho de Macedo seria, assim, um parricida e
daí a regra do art. 588 derivada do “Senatus
Consultus Macedoniano”
Art.
588. O mútuo feito a pessoa menor, sem prévia autorização daquele sob cuja
guarda estiver, não pode ser reavido nem do mutuário, nem de seus fiadores.
O curioso é que
até o fiador do menor plenamente capaz pode se eximir da obrigação, o que, a
meu ver, não faz nenhum sentido, pois tal situação acaba por permitir o enriquecimento
sem causa.
Mas apesar do
rigor da regra prevista no caput do
art. 588, ela comporta inúmeras exceções que estão previstas no artigo
seguinte. Assim, o mútuo não poderá ser reavido do menor, nem de seu fiador,
salvo:
I -
se a pessoa, de cuja autorização necessitava o mutuário para contrair o
empréstimo, o ratificar posteriormente;
II -
se o menor, estando ausente essa pessoa, se viu obrigado a contrair o
empréstimo para os seus alimentos habituais;
III -
se o menor tiver bens ganhos com o seu trabalho. Mas, em tal caso, a execução
do credor não lhes poderá ultrapassar as forças;
IV -
se o empréstimo reverteu em benefício do menor;
V -
se o menor obteve o empréstimo maliciosamente.
Como se vê, as
exceções são tantas e tão amplas que acabam por reduzir significativamente o
impacto na regra geral.
[1] PEREIRA, Caio Mário
Silva. Instituições de Direito Civil - Vol. III - Contratos, 18ª edição.
Forense, 03/2014. VitalBook file.
[2]
http://noticias.terra.com.br/ciencia/pesquisa/crise-da-agua-e-principal-risco-para-2015-revela-pesquisa,ce6b109b603fa410VgnCLD200000b2bf46d0RCRD.html
. Acesso em 21/01/15.
[3] Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos
desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela
entre doze e dezoito anos de idade.
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