CONTRATO DE DOAÇÃO (ART. 538 A 564 DO CC)
1. Conceito
Pela doação, o doador transfere
do seu patrimônio bens ou vantagens para o donatário, sem a presença de
qualquer remuneração. Trata-se de ato de mera liberalidade, sendo um contrato
benévolo, unilateral e gratuito. Sendo negócio jurídico benévolo ou benéfico,
somente se admite a interpretação restritiva, nunca a interpretação declarativa
ou extensiva (art. 114 do CC).[1]
Chama-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade,
transfere de seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra, que os aceita
(Código Civil, art. 538).[2]
Contrato pelo qual uma pessoa, por
liberalidade, se obriga a transferir a outra a propriedade de um bem ou uma
vantagem, sem contraprestação.
O legislador definiu a doação como
contrato porque quis tomar parte numa controvérsia sobre a natureza jurídica da
doação (se pode ou não ser entendida como um contrato). O sistema
franco-italiano a inclui como modalidade específica de aquisição da
propriedade, mas o sistema alemão, ao qual o Brasil se liga neste ponto,
considera a doação como um contrato (GONÇALVES, 2012, p. 278)
2.
Traços
Característicos
Carlos
Robert Gonçalves (2012, p. 278) se refere a traços característicos da doação:
2.1. Natureza
Contratual.
Aponta-se a natureza contratual, com a
qual se concorda, pois o consentimento de ambos – doador e donatário – é
essencial à formação do negócio. Nesta linha de raciocínio, a doação somente se
aperfeiçoará após a manifestação volitiva do donatário. Esta também é a
posição de Maria
Helena Diniz, que entende que a aceitação do donatário é essencial, pois sem
ela o contrato não se forma.
Paulo Luiz de Netto
Lôbo, em sentido diverso, sustenta que a aceitação do
donatário não é mais elemento essencial do contrato, sendo “elemento complementar para tutela dos interesses do donatário, porque
ninguém é obrigado a receber ou aceitar doação de coisas ou vantagens,
inclusive por razões subjetivas”
Tartuce acompanha a doutrina de Paulo Lôbo e esclarece que o
consentimento está no plano da eficácia. Para corroborar sua confirmação, o
autor paulista alude ao art. 539 da codificação. O artigo trata da fixação de
prazo para a aceitação. (silêncio qualificado)
2.1.1.
Aceitação do
Donatário.
a) Expressa
É a forma de aceitação ordinária
(comum), que se expôe de maneira inequívoca, por escrito, gestos, palavras,
sinal de fumaça etc.
A própria doação ao nascituro, que se
subordina a uma condição suspensiva (nascimento com vida do donatário), requer
aceitação expressa de seu representante (art. 542)[3].
Esta disposição, aliás, é utilizada como argumento de adeptos da teoria
personalista de que o nascituro tem personalidade jurídica, já que a lei lhe
reconhece a existência de direitos patrimoniais mesmo antes do nascimento. A
discussão, porém, não termina por aqui, já que um natalista diria que os
direitos patrimoniais estão condicionados ao nascimento com vida, havendo tão
somente expectativa de direito.
b) Dispensa de Aceitação
Há
uma hipótese excepcional, prevista no Código Civil, em que a aceitação é
dispensada. Trata-se da doação pura feita ao absolutamente incapaz, conforme o
artigo 543 do Código:
Art.
543. Se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-se a aceitação, desde
que se trate de doação pura.
Não vejo muito lógica nem rigor técnico
neste dispositivo. Seja um donatário relativamente incapaz, seja absolutamente
incapaz, caberá ao representante legal decidir se ele vai aceitar ou não.
Afinal, o bem doado pode ser uma coisa não indicada para uma criança ou
adolescente.
c) Aceitação Presumida
Trata-se de uma modalidade de que não
resulta da manifestação de vontade expressa do donatário, mas sim de uma
previsão legal, que reconhece a existência da aceitação em situações
específicas, tais como:
è Na situação em
que o doador fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou não a
liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça, dentro dele, a
declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo.
(art. 539)
è Na doação feita
em contemplação de casamento futuro a ser estudada adiante (art. 546)
2.2. Animus Donandi
E o principal elemento: traduz a
intenção de praticar uma liberalidade. Ou seja, é uma ação desinteressada de
conferir a outrem uma vantagem patrimonial sem estar obrigado a tanto.
(GONÇALVES, 2012, p. 279).
Na verdade é este elemento que distingue
a doação de atos gratuitos semelhantes, como o testamento, a remissão, a
renúncia e o comodato. Tudo bem que algumas dessas modalidades são equiparadas,
por exemplo, para efeito de reconhecimento de fraude contra credores[4],
mas não há dúvida que existem importantes diferenças entre elas.
Na doação há um deslocamento patrimonial
que se opera com o enriquecimento do donatário e o correlato empobrecimento do
doador. Já a remissão constitui negócio jurídico bilateral, enquanto a renúncia
é negócio unilateral.
Além do mais, as cortesias, presentes e
esmolas também não caracterizam doação, por faltar o animus donandi, pois “são de mera convivência social cuja
intenção não se insere na definição de negócio jurídico”
2.3. Transferência de bens para o patrimônio do donatário
e
Na doação há um deslocamento patrimonial
que se opera com o enriquecimento do donatário e o correlato empobrecimento do
doador.
3.
Restrições à Doação
A autonomia para a
realização da atos de liberalidade, como a doação, é limitada por uma série de
razões. Se por um lado temos liberdade para dispor sobre nosso patrimônio, há,
por outro, necessidade de tutela de interesses de certos grupos de pessoas ou
até mesmo do próprio doador. Essas limitações à autonomia privada são
restrições que passaremos a analisar:
3.1.
Restrições ao Devedor
Já reduzido à Insolvência. (Proteção dos Credores)
Em primeiro lugar,
restringe-se a liberdade de doar porque os credores têm no patrimônio do
devedor a garantia de seu crédito. Portanto, a fraude contra credores, espécie
de vício social que gera a anulação do contrato, é uma restrição imposta na
defesa dos interesses dos credores do doador.
Art. 158.
Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os
praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda
quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como
lesivos dos seus direitos.
A regra busca
proteger os credores do doador. Afinal, não se pode fazer “caridade com chapéu
alheio”.
3.2.
Doação Universal (Art. 548[5])
(Proteção do Próprio Doador)
3.2.1.
Conceito
É aquela que compreende todo o patrimônio do doador, sem reserva mínima
de parte para a sua mantença. Tal restrição visa garantir o bem estar do doador, reservando-lhe
um mínimo necessário para a uma vida digna. Esta vedação traduz a garantia do
patrimônio mínimo. Uma garantia de dignidade. A dignidade é o alicerce do
sistema. A doação é válida apenas se o doador reservar parte para garantir sua
subsistência.
É aquela que compreende todo o patrimônio do doador, sem reserva mínima
de parte para a sua mantença.
3.2.2.
Sanção Legal
A lei reconhece um defeito muito grave
na doação universal e por isso a qualifica como nulidade. Segundo Silvio
Rodrigues (GONÇALVES, 2012, p. 298) a nulidade recai sobre todos os bens.
Por outro lado, Segundo Pablo
Stolze e Pamplona Filho, é possível a declaração
parcial da nulidade para reduzir a liberalidade a um montante que permita a
manutenção de uma vida digna. Filio-me a este posicionamento em função do
princípio da conservação do negócio jurídico, de forma que a nulidade somente
deve atingir a parte que exceder o mínimo disponível.
Ressalta-se que a
doação com reserva de usufruto não pode ser entendida como universal, vez que o
doador reservar para si a nua propriedade.
3.2.3.
Casuística
Passemos à análise de
dois casos práticos de muita repercussão sobre doação universal. O primeiro
caso é do STJ – REsp 285.421/SP. Neste caso foi reconhecida a doação universal em
acordo de separação judicial.
RECURSO ESPECIAL. DOAÇÃO
UNIVERSAL. ART. 1.175 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 (ART. 548 DO CÓDIGO CiVIL EM
VIGOR). APLICAÇÃO EM ACORDO REALIZADO POR OCASIÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL.
PRECEITO ÉTICO. POSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A proibição
inserta no art. 1.175 do Código Civil de 1916 (art. 548 do Código Civil em
vigor) destina-se a impedir que o autor da liberalidade reduza-se a situação de
pobreza, em razão da doação. Caráter social do preceito em testilha. 2. A
vedação à doação universal realiza a mediação concretizadora do princípio
constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1°, III, da Constituição
Federal). Recursos financeiros suficientes para que as necessidades elementares
da pessoa humana sejam atendidas. 3. Acordos realizados nas separações
judiciais são transações de alta complexidade, tendo em vista a gama de
interesses sensíveis a serem ajustados. Disponibilidade patrimonial para compor
ajustes sobre questões intrincadas. Condescendência econômica de uma das
partes. Limitação. Não se podem solucionar problemas de ordem familiar a
qualquer custo, máxime, quando o preço a ser pago reflete-se na dignidade da
pessoa humana. 4. Incide o preceito ético do art. 1.175 do Código de 1916 (art.
548 do Código Civil em vigor) em acordo realizado, em virtude de separação
judicial. 5. Recurso especial parcialmente provido.
Outro caso muito divulgado foi o reconhecimento de
doação universal na contribuição dada por uma fiel da Igreja Universal de R$
74.000,00. O próprio STJ divulgou o caso por meio de seus órgãos de
comunicação:
A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) terá de
devolver a uma ex-fiel mais de R$ 74 mil, em valores de 2004 a serem
corrigidos. A igreja não conseguiu fazer com que seu caso fosse reavaliado pelo
Superior Tribunal de Justiça (STJ), que manteve a decisão do
Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF).
A fiel trabalhava como contadora. Em 2003, recebeu uma
grande quantia em pagamento de um trabalho. Um pastor da IURD a teria então
pressionado para que fizesse um sacrifício em favor de Deus. A insistência do
pastor incluía ligações e visitas à sua residência.
Segundo alegou, estava em processo de separação
judicial, atordoada e frágil. Diante da pressão, teria feito a doação de mais
de R$ 74 mil, em duas parcelas. Depois disso, o pastor teria sumido da igreja,
sem dar satisfações. A IURD afirmava não saber do ocorrido nem ter como
ajudá-la. Em 2010, a contadora ingressou com ação para declarar nula a doação.
Ela alegou que, após a doação, passou a sofrer de
depressão, perdeu o emprego e ficou em crescente miséria. Testemunhas apontaram
que chegou a passar fome, por falta de dinheiro.
Ato de fé
Para a IURD, atos de doação como esse estão apoiados
na liturgia da igreja, baseada em tradição bíblica. Disse que a Bíblia prevê
oferendas a Deus, em inúmeras passagens.
A defesa da IURD destacou a história da viúva pobre,
em que a Bíblia afirmaria ser muito mais significativo o ato de fé de quem faz
uma doação tirando do próprio sustento.
Assim, a doação da contadora não poderia ser
desvinculada do contexto religioso. A IURD apontou ainda a impossibilidade de
interferência estatal na liberdade de crença, sustentando que o estado não
poderia criar embaraços ao culto religioso.
Além disso, a fiel teria capacidade de reflexão e
discernimento suficiente para avaliar as vantagens de frequentar a igreja e
fazer doações.
Subsistência
Para o TJDF, as doações comprometeram o sustento da
ex-fiel. Entendeu que o ato violava o artigo 548 do Código
Civil, que afirma ser nula a doação
de todos os bens sem reserva de parte ou de renda suficiente para a
subsistência do doador.
O TJDF apontou ainda que o negócio jurídico nulo não
pode ser confirmado nem convalesce com o decurso do tempo. Por isso, não se
fala em decadência no caso.
O tribunal também afastou a análise do caso sob o
ponto de vista do vício de consentimento, já que se discutia a questão da
doação universal de bens.
Declínio
Sob essa perspectiva, as testemunhas apontaram que o
padrão de vida da contadora foi progressivamente reduzido diante das campanhas
de doação. A insistência do pastor teria impedido que ela realizasse seus
planos de investimento do dinheiro recebido, entre eles a aquisição de um
imóvel.
Além disso, o TJDF entendeu que, sendo profissional
autônoma, ela não poderia contar com remuneração regular, e o valor doado
constituiria reserva capaz de ser consumida ao longo de anos na sua manutenção.
Dos autos se extrai um declínio completo da condição
da autora, a partir das doações que realizou em favor da ré, com destaque para
a última, que a conduziu à derrocada, haja vista que da condição de
profissional produtiva, possuidora de renda e bens, passou ao estado de desempregada,
endividada e destituída da propriedade de bem imóvel, afirma a decisão do TJDF.
O tribunal observou ainda que todo o quadro de ruína
econômica em que se inseriu abalou seu estado de ânimo, havendo, ao que consta,
até mesmo sido afetada por depressão, que mais ainda dificultou a reconstrução
de sua vida.
Revisão de provas
No STJ, a IURD pretendia demonstrar que o ato da
contadora não constituía doação universal, já que ela havia mantido um imóvel,
carro e parte da renda obtida com o trabalho.
Mas, para o ministro Sidnei Beneti, a análise da
pretensão recursal da Igreja Universal exigiria o reexame de provas do
processo, o que é vedado em recurso especial. Por isso, o relator negou
provimento ao agravo da igreja, o que mantém a decisão do TJDF.
Encontrei a ementa do acórdão do TJDFT (Apelação Cível nº 2010011108554-4)
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE
NULIDADE DE ATO JURÍDICO. DOAÇÃO. IGREJA. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. NEGÓCIO
JURÍDICO NULO. IMPOSSIBILIDADE DE CONVALIDAÇÃO. ART. 169 DO CC. DOAÇÃO
UNIVERSAL. ART. 548 DO CC. SUBSISTÊNCIA DO DOADOR. COMPROMETIMENTO. AUSÊNCIA DE
INSTRUMENTO PARTICULAR. DOAÇÃO DE ALTO VALOR EM DINHEIRO. IMPOSSIBILIDADE. ART.
541 DO CC. NULIDADE DECLARADA. SENTENÇA MANTIDA.
1 - NÃO HÁ QUE SE FALAR EM DECADÊNCIA, SE O PEDIDO DEDUZIDO NA INICIAL É DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO, POR VIOLAÇÃO AO ART. 548 DO CÓDIGO CIVIL, QUE CONSUBSTANCIA HIPÓTESE DISTINTA DA ATINENTE À ANULABILIDADE POR OCORRÊNCIA DE VÍCIOS DE CONSENTIMENTO E SOCIAIS, PREVISTA NOS INCISOS I E II DO ART. 178 DO CÓDIGO CIVIL. TRATANDO-SE DE NEGÓCIO JURÍDICO NULO, FAZ-SE INSUSCETÍVEL DE CONFIRMAÇÃO E CONVALESCIMENTO PELO DECURSO DO TEMPO, NOS TERMOS DO ART. 169 DO MESMO DIPLOMA LEGAL. PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA REJEITADA.
2 - IMPÕE-SE A DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATO DE LIBERALIDADE PRATICADO EM CONFRONTO COM O PREVISTO NO ART. 548 DO CÓDIGO CIVIL, POIS EVIDENCIADO NÃO HAVER REMANESCIDO RENDA SUFICIENTE PARA A SUBSISTÊNCIA DA DOADORA APÓS A DISPOSIÇÃO DO NUMERÁRIO DOADO.
3 - A FORMA ESCRITA, MEDIANTE CONFECÇÃO DE INSTRUMENTO PARTICULAR, PARA A REALIZAÇÃO DE DOAÇÃO DE DINHEIRO EM VALOR ELEVADO, FAZ-SE ESSENCIAL À VALIDADE DO ATO DE LIBERALIDADE, CONFORME PREVÊ O ART. 541 DO CÓDIGO CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL DESPROVIDA.
1 - NÃO HÁ QUE SE FALAR EM DECADÊNCIA, SE O PEDIDO DEDUZIDO NA INICIAL É DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO, POR VIOLAÇÃO AO ART. 548 DO CÓDIGO CIVIL, QUE CONSUBSTANCIA HIPÓTESE DISTINTA DA ATINENTE À ANULABILIDADE POR OCORRÊNCIA DE VÍCIOS DE CONSENTIMENTO E SOCIAIS, PREVISTA NOS INCISOS I E II DO ART. 178 DO CÓDIGO CIVIL. TRATANDO-SE DE NEGÓCIO JURÍDICO NULO, FAZ-SE INSUSCETÍVEL DE CONFIRMAÇÃO E CONVALESCIMENTO PELO DECURSO DO TEMPO, NOS TERMOS DO ART. 169 DO MESMO DIPLOMA LEGAL. PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA REJEITADA.
2 - IMPÕE-SE A DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATO DE LIBERALIDADE PRATICADO EM CONFRONTO COM O PREVISTO NO ART. 548 DO CÓDIGO CIVIL, POIS EVIDENCIADO NÃO HAVER REMANESCIDO RENDA SUFICIENTE PARA A SUBSISTÊNCIA DA DOADORA APÓS A DISPOSIÇÃO DO NUMERÁRIO DOADO.
3 - A FORMA ESCRITA, MEDIANTE CONFECÇÃO DE INSTRUMENTO PARTICULAR, PARA A REALIZAÇÃO DE DOAÇÃO DE DINHEIRO EM VALOR ELEVADO, FAZ-SE ESSENCIAL À VALIDADE DO ATO DE LIBERALIDADE, CONFORME PREVÊ O ART. 541 DO CÓDIGO CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL DESPROVIDA.
3.3.
Doação Inoficiosa (art. 549[6])
(Legítima dos Herdeiros Necessários)
3.3.1.
Conceito
É aquela que excede à parte que o doador, no
momento da liberalidade, poderia dispor em testamento (parte disponível). A
doação inoficiosa, então, traduz violação da legítima dos herdeiros
necessários.[7]
Percebe-se, assim, que o patrimônio de uma pessoa é
fracionado em parte disponível e a legítima. Assim, para compreendermos a
doação inoficiosa é preciso entender o que significa “patrimônio líquido”,
parte disponível, legítima e quem são, afinal, os herdeiros necessários.
Assim, como o direito também tutela o interesse dos
credores, devemos apurar o patrimônio líquido (P.L) de uma pessoa, para então
chegarmos à parte disponível (P.D) e à legítima. O PL corresponde à diferença
entre o ativo (todos os bens e direitos) e o passivo (dívidas e obrigações).
Ou seja: ATIVO – PASSIVO = PL (Patrimônio Líquido)
Dessa forma, o patrimônio líquido concentra bens e
direitos que estão livres de dívidas, por não representarem garantia de
credores. Mesmo assim, a pessoa não pode dispor livremente sobre esses bens e
dívidas porque a legítima (metade desses bens) está reservada, por lei (art.
1.846), aos herdeiros necessários, que são os descendentes, ascendentes,
cônjuge (art. 1.845[8])
e o companheiro(a) (art. 226,§3º da CR/88 e art. 1.790 do CC[9]).


3.3.2.
Alcance da Nulidade
Em razão do princípio da conservação do negócio jurídico, a nulidade
prevista no art. 549 não atinge todo o ato praticado, mas apenas o montante que
exceder à parte disponível. Trata-se, portanto, de uma nulidade textual. A
título de exemplo, se o doador tem o patrimônio de R$ 100.000,00 e faz uma
doação de R$ 70.000,00, o ato será válido até R$ 50.000,00 (parte disponível) e
nulo nos R$ 20.000,00 que excederam a proteção da legítima.
Ressalta-se que este cálculo deve ser feito no momento da liberalidade e
não posteriormente, quando da morte do doador. Sendo assim, não qualquer
diferença se houve uma variação patrimonial (para mais ou para menos)
posteriormente, como se isso pudesse convalidar a doação feita. Não. A variação
patrimonial superveniente é irrelevante.
3.3.3.
Casuística
A jurisprudência é repleta de casos que envolveram a doação inoficiosa. É
muita briga e disputa por um patrimônio e pouca liberdade para a pessoa:
“Civil. Doação
inoficiosa. 1. A doação ao descendente é considerada inoficiosa quando
ultrapassa a parte que poderia dispor o doador, em testamento, no momento da
liberalidade. No caso, o doador possuía 50% dos imóveis, constituindo 25% a
parte disponível, ou seja, de livre disposição, e 25% a legítima. Este
percentual é que deve ser dividido entre os 6 (seis) herdeiros, tocando a cada
um 4,16%. A metade disponível é excluída do cálculo. 2. Recurso especial não
conhecido” (STJ, REsp 112.254/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 4.ª Turma, j.
16.11.2004, DJ 06.12.2004, p. 313).
SEPARAÇÃO CONSENSUAL
- RECONHECIMENTO DE QUE HOUVE DOAÇÃO INOFICIOSA - PARTILHA QUE DEVE SER ANULADA
- APLICAÇÃO DO ART. 1776 DO CÓDIGO CIVIL. - ART. 535 DO CPC - AUSÊNCIA DE
OMISSÃO. I - Se foi reconhecido que a partilha, em separação consensual, foi
feita em desobediência à Lei, caracterizando verdadeira doação inoficiosa em
favor da esposa, a única conclusão lógica é de que ela deve ser refeita, para
preservar os interesses das partes envolvidas. Devem ser trazidos a colação
todos os bens que integravam o patrimônio do cônjuge falecido, antes da
separação, para efeito do cálculo do que fica como liberalidade e do que vai
para o acervo partilhável (para a herdeira necessária).
II - Ausente qualquer
omissão no aresto recorrido capaz de fulminar-lhe de nulidade. Todas as
questões importantes ao deslinde da controvérsia foram devidamente apreciadas e
bem aplicado o direito à espécie.
III- Recurso não
conhecido (REsp. 154948/RJ)
3.3.4.
Ação para se pleitear a nulidade da parte inoficiosa
a)
Ação Cabível e legitimados
A ação de redução é cabível para a declaração de
nulidade da doação inoficiosa, que atingirá, como visto, o montante que exceder
a parte disponível. Ademais, os legitimados são os herdeiros necessários que
poderão propor a ação mesmo durante a vida do doador[11] e isso se deve porque,
apesar do argumento de que, ajuizada a ação declaratória de nulidade da parte
inoficiosa (ação de redução), antes da abertura da sucessão, estar-se-ia a litigar
em juízo sobre herança de pessoa viva, inclina-se a doutrina pela possibilidade
de tal ação ser ajuizada desde logo, não sendo necessário aguardar a morte do
doador.[12]
b)
Prazo para o Ajuizamento da Ação de Redução
Cogitar sobre prazo para o ajuizamento de uma ação
declaratória de nulidade já deveria despertar a suspeita de um jurista mais
atento, pois é cediço que atos nulos não se convalidam (art. 169 do CC[13]).
Apesar deste rigor técnico, fica latente uma
incômoda questão, pois a inexistência de um prazo para a declaração da nulidade
realmente traz insegurança jurídica, pois o beneficiário da doação, muitas
vezes de boa fé, fica com a convicção de que aquela situação se consolidou nos
anos que se passaram (décadas, até...), quando se vê no polo passivo de uma
ação de redução de doação inoficiosa.
O interessante é que o atual Código manteve a
redação do art. 1.176 do Código Civil de 1916, com supressão de apenas algumas
vírgulas.
Art. 1.176 CC/16
|
Art. 549 CC/16
|
Art. 1.176.
Nula é também a doação quanto á parte, que exceder a de que o doador, no
momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.
|
Art. 549. Nula
é também a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da
liberalidade, poderia dispor em testamento.
|
Mesmo assim, ainda não existe consenso doutrinário
a respeito da existência ou não de prazo para a invalidação do ato. Existem
basicamente duas correntes opostas:
A primeira delas sustenta que se trata de ordem
pública e que, por isso, não está sujeita a prazo. Trata-se de uma corrente que
se apega ao rigor técnico, pois realmente a lei qualifica como nula a doação
inoficiosa. Então, se a nulidade é um defeito mais grave que ofende interesse
de ordem pública, não haveria realmente um prazo para o ajuizamento da ação.
Por outro lado, uma segunda e não menos abalizada
corrente, defende que, como a situação envolve direitos patrimoniais
disponíveis, a ação deveria estar sujeita a um prazo prescricional. Assim, pela
omissão da lei, aplicar-se-ia, segundo esta corrente, o prazo prescricional de
10 anos.
Inclusive os autores Pablo Stolze Gagliano e
Rodolfo Pamplona Filho sustentam uma posição similar. A
ação para declarar a nulidade da doação inoficiosa não se sujeita a prazo
algum, mas a pretensão de reivindicar os bens doados em excesso e a de perdas e
danos se sujeitam ao prazo prescricional do art. 205 do CC (10 anos) (2012,
P148).
Entretanto, a polêmica parece não persistir na
jurisprudência. O STJ entende que o prazo deduzir judicialmente pretensão para
declarar a nulidade de doação oficiosa sujeita-se ao prazo geral da prescrição,
hoje decenal (art. 205). Vários são os precedentes. Comecemos pelos mais
recentes.
Um da Terceira
Turma, julgado em 07/08/2014, veja:
“[...] Aplica-se às pretensões declaratórias de nulidade de doações inoficiosas o prazo prescricional decenal do CC/02, ante a inexistência de previsão legal específica. Precedentes. (REsp 132198/RS) [...]”
Nota-se, no voto deste acórdão, que a relatora
mencionou diversos precedentes do STJ que seguem o mesmo entendimento. Vejamos
o trecho:
“ [...] 08. A partir dessas
considerações, com efeito, a jurisprudência do STJ, é pacífica no sentido de
que incide sobre as pretensões declaratórias de nulidade de doação inoficiosa o
prazo prescricional decenal (art. 205 do CC/02), por ausência de previsão
específica, e contado a partir da data da prática do ato nulo. Nesse sentido: REsp 1.049.078/SP, Rel. Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, DJe 01/03/2013; e REsp 259.406/PR, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 4ª Turma, DJ
04/04/2005; entre outros.
A relatora também afastou a possibilidade de
aplicação do prazo bienal previsto no artigo 178[14], isso porque “[...] as
hipóteses de defeitos dos negócios jurídicos resguardam o agente e sua livre
manifestação de vontade no momento do aperfeiçoamento do negócio entre as
partes, ou seja, apenas o próprio contratante tem legitimidade para pleitear a anulação
de negócio para o qual anuiu de forma viciada.”
Por fim, pela leitura do acórdão, nota-se que a
relatora afastou a aplicação de qualquer prazo decadencial, pois o que discute
é direito de terceiros atingidos pela prática de um ato nulo, no qual não teve
participação.
Agora um ainda mais recente da Quarta Turma, julgado em 16/09/14:
“[...] CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DOAÇÃO DE ASCENDENTE A DESCENDENTE. NULIDADE. PRESCRIÇÃO. MARCO INICIAL. DATA DA LIBERALIDADE. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, no caso de ação em que se busca invalidar doação inoficiosa, o prazo prescricional é vintenário e conta-se a partir do registro do ato jurídico impugnado. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AgRg no AREsp 332566/PR)
3.4.
Doação de Ascendentes para Descendentes e Doação entre Cônjuges (544[15])
Ao contrário do que se passa na compra e venda de ascendente para
descendente, em que se exige a autorização dos descendentes e do cônjuge do
alienante para a conclusão do negócio, na doação isso não é preciso. Ou seja: O
pai pode doar livremente seus bens em prol de um determinado filho sem que os
outros possam pretender anular o negócio ao fundamento de que não concordaram.
A lei simplesmente dispensa a autorização prévia e a doação feita, ainda que
ultrapasse a parte disponível (inoficiosa), é válida e eficaz.
Em contrapartida, o descendente ou cônjuge beneficiado, quando da morte
do doador e sucessor, deverão colacionar os bens que receberam para que se
promova a partilha em conformidade com as previsões legais. Portanto,
colacionar significa basicamente o dever que o herdeiro tem de descrever os
bens que estão em seu poder para que sejam levados e relacionados no
inventário.
Mas é claro que este dever pode ser descumprido, e frequentemente o é.
Neste caso, aplica-se ao herdeiro donatário inadimplente a pena de sonegados,
podendo o herdeiro perder o direito que lhe cabia sobre aqueles bens. (art.
1.992[16])
Ressalta-se, por fim, que o herdeiro só estará dispensado da colação se
o doador expressamente o dispensar deste dever, na chamada doação com dispensa
de colação (art. 2.006[17] do CC). A dispensa de
colação, portanto, é um mecanismo pelo qual o doador ou testador pode
estabelecer quinhões hereditários diversos dos previstos em lei, beneficiando
certos herdeiros em detrimento de outros.
3.5.
Doação Do Cônjuge Adúltero a Seu Cúmplice (art. 550[18])
3.5.1.
Caracterização do ato
O art. 550
prevê uma polêmica restrição quanto à proibição da doação aos concubinos. Assim dispõe o 550: “A doação do cônjuge adúltero ao
seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros
necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal.”
Com efeito, a
caracterização do ato depende da presença dos seguintes requisitos:
è Prova da relação concubinária (art. 1.727[19]) e
è doação ao concubino
3.5.2.
Interesse Protegido
Entendo que a
norma está orientada por um valor (não é princípio) que o direito insiste em
tutelar: a monogamia. Indiretamente, procura-se preservar a estabilidade
patrimonial do casamento e dos próprios herdeiros necessários.
3.5.3.
Alcance da Norma
Tal proibição
tem por alcance somente as pessoas
casadas, não se aplicando às solteiras, separadas ou divorciadas, ou unidas
pelo companheirismo. Assim entendeu a 4.ª Turma do Superior Tribunal de
Justiça, em julgamento anterior ao Código Civil de 2002 (RSTJ 62/193 e
RT 719/258).
Esse
entendimento deve ser aplicado aos casos de ser o doador casado, mas separado
de fato, judicial ou extrajudicialmente (art. 1.723, § 1.º, do CC e Lei
11.441/2007), mesmo sendo o donatário o pivô da separação. Precedentes
do STJ confirmam esta afirmação, vejamos:
“[...] DIREITO CIVIL. DOAÇÃO. AQUISIÇÃO DE IMÓVEL EM NOME DA COMPANHEIRA POR HOMEM CASADO, JÁ SEPARADO DE FATO. DISTINÇÃO ENTRE CONCUBINA E COMPANHEIRA. As doações feitas por homem casado à sua companheira, após a separação de fato de sua esposa, são válidas, porque, nesse momento, o concubinato anterior dá lugar à união estável; a contrario sensu, as doações feitas antes disso são nulas. [...]” (REsp 408.296/RJ)
3.5.4.
Críticas
a)
Sobre a Terminologia Empregada
Para começar, é
abominável a utilização das expressões “adúltero” e “cúmplice”, que se
encontram superadas, eis que não existe mais o crime de adultério, desde a Lei
11.106/2005.
b)
Quanto ao Fundamento
Quanto ao
fundamento da restrição, Cristiano Chaves
e Nelson Rosenvald não poupam críticas ao dispositivo, taxando-o de
excessivamente moralista. De fato, o legislador demonstra preocupação
exacerbada com a preservação da fidelidade nas relações conjugais. Os autores
apresentam vários argumentos. Em primeiro lugar, mencionam o direito comporado,
pois a legislação de vários países não incorpora dispositivo semelhante, tais
como a da Itália, Portugal, França e Alemanha.
Frisam, ainda, que, na
esfera penal, a lei 11.106/05 revogou o art. 240 do CP (abolitio criminis). Ou seja, o descumprimento do dever de
fidelidade nas relações conjugais deve produzir efeitos apenas no campo da
responsabilidade civil.
c)
Conflito com o art. 1.642, V do Código
Civil.
3.º) O art. 550
do CC entra em conflito com o art. 1.642, V, do CC. Isso porque o primeiro
dispositivo menciona a anulação nas hipóteses de doação ao cúmplice, enquanto o
último prevê a possibilidade de uma ação reivindicatória a ser proposta pelo
outro cônjuge. Como se sabe, a ação de anulação está sujeita a prazo
decadencial, enquanto a ação reivindicatória ou está sujeita à prescrição ou é
imprescritível.
Ademais, o
inciso V do art. 1.642 acaba prevendo um prazo para a união estável, de forma
invertida (cinco anos). Pelo menos para esse caso. Nesse sentido, acaba
entrando em conflito com o art. 1.723, caput, do CC, que dispensa
prazo para a sua caracterização.
Na verdade, o art. 550 do CC é polêmico, parecendo-nos a sua redação um
verdadeiro descuido do legislador, um grave cochilo. A sua aplicação
somente será possível se o doador não viver em união estável com o donatário,
havendo uma doação a concubino, de bem comum, na vigência do casamento.
Para esses casos, por ter sentido de maior especialidade, o art. 550 do CC
prevalece sobre o art. 1.642, V, da mesma codificação.
3.5.5.
Espécie de Invalidade
e Ação Cabível
A doação ao concubino é qualificado como defeito que atinge interesses
particulares. Trata-se, portanto, de ato anulável. Com efeito, a ação anulatória
da doação deve ser proposta no prazo de 2 (dois) anos contados da dissolução da
sociedade conjugal (art. 1.571)[20].
Quanto ao prazo e o termo inicial, podem surgir problemas quando o
cônjuge prejudicado não tem ciência da doação no momento da dissolução da
sociedade conjugal. Cogita-se, também, das estratégias que o cônjuge doador
poderia se utilizar, pois este, ao perceber o término do relacionamento,
poderia realizar a doação com menos de um mês de antecedência do divórcio, de
modo a reduzir o prazo decadencial da ação anulatória.
Por outro lado, o termo inicial apontado pela lei pode trazer o
inconveniente despertar conflitos que o tempo já tinha se encarregado de sanar,
como na hipótese em que o cônjuge traído tinha perdoado a atitude de seu
consorte. Com o divórcio, os rancores retornam, e o cônjuge traído, só de
pirraça, pode pretender anular a doação. Esta situação, aliás, seria um bom
exemplo do venire contra factum proprium.
Diante desses inconvenientes, alguns autores propõem a aplicação da
teoria da actio nata, sustentando que
o prazo decadencial deve fluir a partir da ciência inequívoca sobre a prática
do ato.
Contudo, o STJ parece seguir o texto rígido da lei, ao entender que o
prazo da ação anulatória flui a partir da dissolução formal do casamento.
Ressalta-se apenas que o acórdão decidiu situação regida pelo Código Civil de
1916.
CIVIL - DIREITO DE FAMÍLIA - ANULAÇÃO DE DOAÇÃO À CONCUBINA - PRESCRIÇÃO - TERMO INICIAL - DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL. 1. Em caso de fraude, o prazo prescricional da ação anulatória de doação do art. 1.177 do CC/1916, inicia-se com a dissolução formal do casamento. (REsp 72.997/SP)
3.5.6.
Legitimados
Pelo art. 550, os legitimados são o cônjuge traído, ou seus herdeiros
necessários. Fica a questão: Trata-se de legitimidade concorrente (a ação pode
ser proposta tanto pelo cônjuge como pelos herdeiros) ou sucessiva (a princípio
cabe somente ao cônjuge. Somente com a morte deste, a legitimidade se transfere
aos herdeiros)?
Ora, quem deve saber se foi traído ou não é o cônjuge. Essa é uma
questão que diz respeito unicamente a ele. Influências de terceiros existem e
são freqüentes, mas cabe ao cônjuge essa decisão. É como diz aquele ditado: o corno é o último
a ficar sabendo.
4.
Demais Espécies de
Doação
4.1.
Doação Pura e
Contemplativa
A doação pura é espécie comum, tradicional, aquela totalmente desprovida
de qualquer interesse. É essencialmente uma liberalidade. O doador destaca um
bem de seu patrimônio e transfere para um terceiro, sem nada em troca, nem
mesmo um favor.
É também considerada doação pura a doação em contemplação de
merecimento, prevista no artigo 540 do Código Civil. Assim, a doação
contemplativa é aquela feita em contemplação a um merecimento do donatário, que
para o doador é digno de uma recompensa. Exemplo típico pode ocorrer no caso de
alguém que doa vários livros a um professor famoso, pois aprecia o seu
trabalho, constando esse motivo no instrumento contratual. (TARTUCE, 2014, 336)
Ou ainda: “doarei 1.000,00 reais a Pedro, pelo seu espírito de
beneficência, altruísmo e compreensão” (GAGLIANO; FILHO, 2012, p. 154)
É a modalidade em que o doador determina, expressamente, quais são os
motivos que o fizeram decidir pela celebração do contrato de doação. Geralmente
o doador leva em consideração uma qualidade pessoal do donatário, não perdendo
o caráter de liberalidade – ou seja, o caráter de doação pura e simples –, caso
se descubra que o donatário não a mereça. Não há qualquer consequência prática
dessa denominação, pois a doação contemplativa está sujeita às mesmas regras
que a doação pura e simples.
4.2.
Doações Onerosas
Ao lado da doação pura pode-se elencar algumas espécies de doações que
podem ser classificadas como “onerosas”, seja porque algum encargo é imposto ao
donatário, ou seja porque a doação foi feita como recompensa a serviços
prestados gratuitamente pelo donatário. Essas espécies de doações sujeitam-se a
algumas regras que não se aplicam às doações puras, vejamos um exemplo:
Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato
comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem
imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.
Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo
às doações onerosas.
4.2.1.
Doação Modal ou Com
Encargo (art. 553)
a)
Conceito
A doação modal ou com encargo, também chamada de doação gravada (art.
540 do CC) ou às vezes até chamada de “doação onerosa”, é aquela pela qual o
doador transfere parte de seu patrimônio para do donatário, para que (ou afim
de que) este se desencarregue de um ônus que pode beneficiar o próprio doador,
um terceiro ou a coletividade. Por exemplo: A doa um terreno a B para que este
construa em parte dele um asilo. (TARTUCE, 2014, p. 335). Ou ainda: A doa um
imóvel a B, impondo a este o encargo de pagar uma pensão a uma senhora idosa,
até que a mesma complete 85 anos. (GAGLIANO; FILHO, 2012, p. 134)
Há divergência doutrina em saber se o ônus ou encargo desnatura a
natureza gratuita deste tópico, mas tal análise será abordada no tópico que
abordará as características e a classificação do contrato de doação.
Por ora, vejamos quais são as implicações práticas de uma doação
onerosa.
b)
Implicações práticas.
Em primeiro lugar, aplicam-se à doação onerosa as disposições sobre os
vícios redibitórios, como visto acima (art. 441, p. único). Ademais, esta
modalidade de doação pode ser revogada caso o donatário não cumpra o encargo,
já que o donatário é obrigado a cumpri-lo (art. 553). Analisaremos
detalhadamente esta questão no tópico sobre a revogação da doação. De qualquer
forma, é oportuno adiantar que a doação com encargo já cumprido não pode ser
revogada por ingratidão (art. 564, II), afinal, só assume o caráter de
liberalidade a parte que excedeu o encargo imposto.
4.2.2.
Doação Remuneratória (art.
540)
O Código Civil não
conceitua a doação remuneratória, mas refere-se a ela no art. 540. Comecemos
por ele, então:
Art. 540. A doação feita em contemplação do
merecimento do donatário não perde o caráter de liberalidade, como não o perde
a doação remuneratória, ou a gravada, no excedente ao valor dos serviços
remunerados ou ao encargo imposto.
a) Conceito
A doação remuneratória
é aquela feita em caráter de retribuição por um serviço prestado pelo
donatário, mas cuja prestação não pode ser exigida pelo último. Isso porque,
caso fosse exigível, a retribuição deveria ser realizada a título de pagamento,
uma das formas de extinção das obrigações.
Em outras
palavras, a doação remuneratória é uma
espécie de “recompensa”, pois é
realizada como uma retribuição por serviços gratuitamente prestados pelo
beneficiário. (consultas médicas, declaração de IRPF, conselhos). Importante frisar:
a doação remuneratória não é pagamento, mas recompensa por “favores” recebidos.
b) Exemplos
É o caso do médico da família, que serviu ao doador, com dedicação
durante toda a vida, sem cobrar nada por isso. (GAGLIANO; FILHO, 2012, p.
154-155).
c) Particularidade
(decorre do art. 540)
Somente haverá liberalidade na parte que exceder o valor do
serviço prestado, conforme dispõe o art. 540 do CC. Logo, o valor da
liberalidade que estiver incluído no valor dos serviços prestados é entendido
como pagamento.
d) Importância
Para o Direito
Civil, a análise ou configuração da doação remuneratória é pertinente por três
razões: i) Cabe a alegação de vício redibitório quanto ao
bem doado, eis que se trata de uma forma de doação onerosa (art. 441, parágrafo
único, do CC) ii) Não se revogam por ingratidão as doações puramente
remuneratórias (art. 564, I, do CC) iii) As doações remuneratórias de serviços
feitos ao ascendente não estão sujeitas a colação (art. 2.011 do CC).
e)
Caso do Gato Castrado. Para Diferenciar
Doação com Encargo da Remuneratória
Um curioso caso
proveniente do TJSP (Apelação Cível n. 0108797-57.2006.8.26.0100) é elucidativo
para entender a diferença entre a doação com encargo e a remuneratória, assim
como compreender a diferença prática entre uma e outra.
Uma senhora,
dona de um gatil, fez uma doação de um felino persa de nome Aleph para uma
veterinária. Segundo a autora, a doação foi gravada com o encargo, pois a
veterinária deveria castrar o gato para evitar a proliferação da espécie, já
que o animal apresentava um defeito genético que poderia comprometer seus
descendentes.
Mas de acordo
com a doadora, a donatária não teria cumprido o encargo, pois o gato doado se
acasalou e gerou vários descendentes. Dessa forma, a doadora, possivelmente
receosa da donatária pretender uma concorrência desleal com ela, moveu ação de
revogação da doação pelo descumprimento do encargo.
Sucede que, no
curso do processo, ficou comprovado que a donatária, profissional da
veterinária, realizou serviços gratuitamente para a doadora durante anos, sem
cobrar absolutamente nada.
Ou seja: diante
dos fatos, foi crucial determinar a espécie de doação, pois a solução seria
completamente diferente se entendesse entre uma e outra. Isso acontece porque a
doação com encargo realmente pode ser revogada em caso de descumprimento, como
veremos adiante. Por outro lado, a doação puramente remuneratória não pode ser revogada,
afinal, ela é uma recompensa por serviços gratuitamente prestados pelo
donatário.
E no caso em
análise realmente entendeu-se que houve doação remuneratória. Inclusive foi o
próprio advogado da autora que contou, na petição inicial, que a veterinária
prestou serviços gratuitamente à doadora, possivelmente por não entender a
diferença entre essas duas espécies de doação. Vale a pena conferir o acórdão.
4.3.
Doação Sob Forma de
Subvenção Periódica (Doação de Rendas) (Art. 545[21])
a) Conceito
Trata-se de uma doação de trato
sucessivo, em que o doador estipula rendas a favor do donatário (art. 545 do
CC). Esta modalidade de doação apresenta duas características principais. A
primeira delas é que a contribuição é feita periodicamente pelo doador, como
uma renda mensal, sendo que o beneficiário pode ser uma pessoa natural ou
jurídica. Cite-se, por exemplo, a atitude daqueles que contribuem mensalmente
com determinada quantia para uma fundação engajada em ações de proteção à
criança, como a fundação Abrinq.
Além de ser um contrato de prestação
continuada (primeira característica), a doação em contemplação pode ser
classificado como personalíssimo
porque ele se extingue necessariamente com a morte do donatário. Aliás, também
ocorre a extinção com a morte do doador, salvo previsão contratual diversa.
b)
Doação na forma de Subvenção Periódica e Contrato de Constituição de
Renda
Há muita semelhança entre esta espécie
de doação e outra modalidade típica de contrato denominada “constituição de
renda”, regulada entre os artigos 803 a 813 do Código Civil. Em ambos os casos,
uma pessoa se beneficiará com uma pensão periódica. No entanto, a constituição
de renda é um contrato solene, pois exige escritura pública como condição de
validade (art. 803), enquanto que a doação é um contrato que exige a forma
escrita, como regra. Outra diferença é que a constituição de renda pode assumir
a forma onerosa ou gratuita, enquanto que a subvenção periódica é
necessariamente gratuita.
4.4.
Doações Condicionais
Neste tópico serão
elencadas algumas espécies que mantém uma característica em comum: a eficácia
de cada uma delas está subordinada a um evento futuro e incerto (condição), que
pode ser de dois tipos:
a)
Condição suspensiva, que impede a produção dos efeitos do negócio na
origem até a sua implementação ou;
b)
Condição resolutiva, a qual não impede a produção dos efeitos do
negócio, que são produzidos normalmente desde a conclusão da avença, mas que
cessam caso a condição resolutiva venha a se implementar.
Um detalhe: quando se
falar em produção de efeitos, o principal é a transmissão da propriedade da
coisa doada, seja pela tradição ou pelo registro no CRI.
Vejamos cada uma
dessas espécies:
4.4.1.
Doações Subordinadas
à Condição Suspensiva
a) Doação ao Nascituro, Prole Eventual e Embrião
A doação ao nascituro
não produz efeito enquanto não implementada a condição suspensiva, qual seja, o
nascimento com vida do nascituro. Em outras palavras, se o donatário não nascer
com vida, caduca a liberalidade, pois se trata de direito eventual, sob
condição suspensiva (TARTUCE, 2014, p. 337). Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo
Pamplona Filho também entendem que a doação ao nascituro se subordina a uma
condição suspensiva. Nas palavras dos citados autores:
“[...] Nesse
contexto, vale salientar que “nascituro” é termo técnico, que traduz o ente concebido, com vida intrauterina, mas
ainda não nascido. Nada impede, pois, que alguém pretenda fazer uma doação
de bens ou valores ao nascituro, não obstante esta estipulação negocial esteja
subordinada a uma condição supsensiva (nascimento com vida do donatário).
[...]”
Durante a situação de
pendência, na condição resolutiva, os interessados (pais do nascituro) poderão
praticar atos de conservação da coisa, nos termos do artigo 130 do Código
Civil.
b)
Doação
à Entidade Futura (art. 554[22])
Semelhante à hipótese
do nascituro, a doação também pode ser feita a um ente coletivo que foi
idealizado ou está em fase de constituição, mas que ainda não adquiriu
personalidade jurídica, como um projeto de fundação, associação ou sociedade.
Trata-se igualmente de uma doação sob condição suspensiva, pois o negócio fica
pendente até a regularização da empresa. No entanto, a situação de pendência do
negócio tem um prazo determinado por lei – 2 anos – ao fim do qual a doação
caducará, se a pessoa jurídica não for constituída.
4.4.2.
Doações Subordinadas a uma Condição Resolutiva
a) Doação Contemplativa (Propter Nuptias[23])
É aquela realizada em contemplação de casamento futuro com pessoa certa
e determinada. Nos termos literais do art. 546 do CC, tal doação pode ser
celebrada entre os próprios nubentes entre si; por um terceiro (um padrinho,
por exemplo) a um deles ou a ambos ou aos filhos que nascerem do casamento.
Nota-se
que, ao contrário das modalidades anteriores (doação ao nascituro e a entidade
futura), a doação contemplativa ou propter
nuptias está subordinada a uma condição resolutiva, pois a parte final do
artigo 546 dispõe que “ [...] e só ficará sem efeito se o
casamento não se realizar.” Assim, a partir de uma interpretação a contrario sensu, tem-se que os efeitos
são produzidos desde a origem.
Isso significa que, feita a tradição ou o registro, conforme o caso,
na doação contemplativa, a propriedade resolúvel dos bens é transmitida ao
donatário, ou seja, o noivo, a noiva, o casal de namorados.
No entanto, entendo que se a doação for feita diretamente à prole
eventual (aos filhos que, de futuro, houverem um do outro), seria caso de
condição suspensiva, pois do contrário a propriedade resolúvel se transmitiria
ao casal e, só depois do nascimento dos filhos comuns, a propriedade lhes seria
transmitida.
b) Doação Com Cláusula de Reversão (art. 547[24])
É aquela em que o doador estipula que os bens doados voltem ao seu
patrimônio se sobreviver ao donatário (art. 547 do CC). Trata-se esta cláusula
de uma condição resolutiva expressa, demonstrando o intento do doador de
beneficiar somente o donatário e não os seus sucessores, sendo, portanto, uma
cláusula intuitu personae que veda a doação sucessiva.
Não há dúvida, portanto, que a doação com cláusula de reversão está
subordinada a uma condição resolutiva. De fato, os efeitos do contrato já são
produzidos na origem, pois o donatário adquire a propriedade resolúvel do bem
doado. É resolúvel porque, se ele falecer primeiro que o doador, a propriedade
retorna para o doador e não se transmite para os herdeiros do donatário
falecido.
O evento é futuro e incerto, pois nada pode garantir que o donatário
morrerá antes do doador.
Mas uma atenção especial deve ser dada a um ponto importante: não
prevalece a cláusula de reversão em favor de terceiros. Doador e donatário
estão proibidos de nomear, no instrumento do contrato de doação, terceiros que
receberiam a propriedade em caso de morte do donatário. Por que isso?
Penso que a proibição de se estabelecer reversão em favor de terceiros é
para não fazer de um contrato de doação um instrumento similar ao testamento,
mas sem as formalidades deste. Doação é negócio jurídico que produz efeitos em
vida, enquanto o testamento é o instrumento legal por excelência para a
transmissão da propriedade após a morte.
Segundo Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, a reversão em favor de terceiro
funcionaria como uma cláusula fideicomissária com efeitos em vida. Isso não
seria possível, por ser negócio jurídico com objeto herança de pessoa viva.
(GAGLIANO; FILHO, 2012, p. 343)
Por fim, vale salientar que a cláusula de reversão em favor do doador
não impede que o donatário possa vender o bem a terceiros. No entanto,
implementada a condição, a propriedade, também resolúvel, adquirida pelo
terceiro se resolve, pois o título aquisitivo (matrícula imobiliária, por
exemplo) indica a cláusula de reversão, o que faz que os efeitos sejam
retroativos (ex tunc) (art. 1.359)
É claro que a cláusula de reversão, para que tenha eficácia em relação
ao terceiro, deve ser indicada no título aquisitivo da propriedade. Por
exemplo:
A doa para B um imóvel com cláusula de reversão. A escritura pública
menciona a existência da cláusula e o contrato é registrado regularmente em
cartório, conforme os trâmites legais. Posteriormente, B vende o imóvel para C,
o qual não tem como alegar desconhecimento da cláusula de reversão, pois ela
estará lá indicada na matrícula do imóvel. Sendo assim, C comprou o imóvel assumindo
um sério risco, pois sua propriedade pode se resolver em benefício de A se B
falecer antes.
Agora observe o art. 1.359 e veja porque o implemento da condição (morte
de B) opera efeitos ex tunc:
Art. 1.359.
Resolvida a propriedade pelo implemento da condição ou pelo advento do termo,
entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos na sua pendência, e
o proprietário, em cujo favor se opera a resolução, pode reivindicar a coisa do
poder de quem a possua ou detenha.
4.5.
Doação Conjuntiva (art. 551[25])
a)
Conceito
Quando um mesmo
bem for doado a duas ou mais pessoas ao mesmo tempo, forma-se, entre os
donatários, um condomínio voluntário, que surge pela vontade das partes. O
condomínio é o exercício simultâneo dos poderes da propriedade (art. 1.228) por
duas ou mais pessoas ao mesmo tempo. Além do mais, cada condômino é titular de
uma fração ideal (uma quota condominial) sobre o bem. E se as partes não
estabelecerem qual será a fração de cada um, e aqui entra o artigo 551,
entende-se distribuída entre elas por igual (cada um terá igual fração ideal).
Portanto, se a A
doa um carro para B e C, cada um dos donatários terá uma fração de 50% sobre
este bem indivisível. E como anotam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona “[...] a
distribuição equitativa das quotas ou partes da coisa doada somente ocorrerá
caso o doador, segundo a sua autonomia de vontade, não houver disposto em
sentido contrário (ex: 20% caberá a Pedro e 80% a João) (GAGLIANO; FILHO, 2012,
p. 156)
b)
Direito de
Acrescer
O mais
importante da doação conjuntiva é entender o que vem a ser o direito de
acrescer. Afinal, como ficaria a distribuição das frações ideais no condomínio
se um dos condôminos donatários falecer? Tome-se o exemplo acima para
facilitar: B e C receberam um carro e cada um deles é titular de 50% sobre o
valor do veículo. Na hipótese da morte de C, como fica a transmissão da sua
parte. Ela é destinada aos herdeiros ou ao outro condômino (B)?
A resposta é a
seguinte: a fração ideal de C é transmitida aos herdeiros dele e não é
acrescida ao patrimônio de B. Usando agora termos técnicos, pode-se dizer que
não há direito de acrescer em favor de B, ou seja, o condômino que permaneceu
vivo não adquirirá a fração do outro.
No entanto, é
possível a estipulação do direito de
acrescer convencional, por meio de uma cláusula no contrato de doação.
Neste caso, com a morte de um dos co-donatários, a fração deste se transfere ao
outro condômino e não aos herdeiros do falecido.
Agora, se os
donatários forem marido e mulher, o Código Civil estabelece um direito de acrescer legal em favor do
cônjuge sobrevivente, nos termos do parágrafo único do artigo 551, veja:
Parágrafo único.
Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade
a doação para o cônjuge sobrevivo.
Isso significa
que as regras sucessórias são desconsideradas, ou seja, os descendentes não
concorrerão com o cônjuge supérstite na sucessão hereditária, pois a parte do falecido
tocará integralmente ao outro.
Para finalizar,
duas observações: a primeira é que, por questões de tratamento igualitário,
entendo que o direito de acrescer legal também se estende ao companheiro
sobrevivente. A segunda é na verdade uma questão: o direito de acrescer legal
subsiste se os cônjuges estiverem casados, porém separados de fato?
Ao examinar um
caso desse tipo, o TJMG entendeu que não, já a separação de fato põe fim aos
deveres conjugais e também faz cessar a relação patrimonial do casal. Não
concordo com este posicionamento, pois o direito de acrescer é um direito real
do cônjuge sobrevivente que não integra o acervo de bens hereditários. Segue a
ementa do acórdão (Apelação Cível n. 1.0069.01.000209-0/005)
EMENTA: DIREITO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - DOAÇÃO CONJUNTIVA - DIREITO DE ACRESCER - PARÁGRAFO ÚNICO, ART. 551, CC/02 - INAPLICABILIDADE - SEPARAÇÃO DE FATO - COMPROVAÇÃO INEQUÍVOCA - EFEITOS PATRIMONIAIS.
- Nos termos do que dispõe o parágrafo único do art. 551 do CC/02, se os beneficiados da doação conjuntiva são marido e mulher, a regra é o direito de acrescer, e, portanto, com o falecimento de um dos donatários, a doação subsiste, na totalidade, para o cônjuge sobrevivente.
- Inaplicável a regra do direito de acrescer quando inequívoca a separação de fato, o que, consoante a assente jurisprudência pátria, põe fim não só aos deveres conjugais, mas igualmente faz cessar a relação patrimonial do casal.
4.6.
Doação Manual (art. 541[26])
A
doação monual é a espécie que têm por objeto bens móveis de pequeno valor. Sua
característica princicipal é que ela pode assumir a forma livre, desde que o bem seja entregue incontinenti a doador. Em razão desta característica, a doação deve
ser vista como exceção à regra, já que, nos termos do art. 541, caput, o contrato de doação deve ser
celebrado por escrito ou, dependendo do caso (art. 108, por exemplo), exige
escritura pública como requisito de validade.
Não há um critério
previsto para se determinar se o bem é ou não de pequeno valor. No direito
penal, por exemplo, a concessão do privilégio previsto no art. 155,§2º[27]depende,
dentre outros requisitos, que o bem seja considerado de pequeno valor. No caso,
a jurisprudência do STJ pacificou o entendimento de que o bem de pequeno valor
é aquele que for inferior ao valor do salário mínimo[28].
Mas este não é
recomendável que este critério seja aplicado ao direito civil, para determinar
se uma doação pode ou não assumir a forma verbal. Neste aspecto, entendo que
razão está com Washington de Barros Monteiro, segundo o qual se deve ter em
conta a fortuna do doador, afinal, aquilo que é de pequeno valor para uns pode
ser valioso para outros.
A doação manual já
foi discutida num interessante caso decidido pelo STJ. Um dono de uma casa de
câmbio namorou uma advogada militante entre o final de 1992 e meados de 1994.
Neste período, o namorado, pessoa abastada, deu inúmeros presentes, inclusive
um vestido de R$ 2.000,00 à namorada. Além disso, ele também deu à ela um veículo
Mitubishi Pajero e fazia periodicamente depósitos em dinheiro na conta dela. Ao
término do relacionados aconteceu o que todos sabem: “de meu bem pra cá e meu
bem pra lá passou a meus bens pra cá e seus bens pra lá”. Então o ex-namorado,
dono da casa de câmbio, propôs ação pedindo a devolução dos valores
depositados, que ao todo somavam quarenta mil reais, afirmando tratar-se de
contrato de mútuo. No entanto, pelas provas produzidas no processo, ficou
entendido que mútuo não se tratava, mas sim de doação. E o interessante é que,
mesmo as quantias e os bens de pequeno valor dispensaram a forma escrita para
valerem como doação. Sendo assim, a ementa do acórdão foi elaborada nos
seguintes termos:
Direito Civil e Processual Civil. Doação à namorada. Empréstimo. Matéria de prova.
I - O pequeno valor a que se refere o art. 1.168 do Código Civil há de ser considerado em relação à fortuna do doador; se se trata de pessoa abastada, mesmo as coisas de valor elevado podem ser doadas mediante simples doação manual (Washington de Barros Monteiro).
II - No caso, o acórdão recorrido decidiu a lide à luz da matéria probatória, cujo reexame é incabível no âmbito do recurso especial.
III - Recurso especial não conhecido.
Particularmente
concordo que o critério para se definir o que é bem de pequeno valor não pode
ser objetivo (um salário, trinta salários etc), mas o que se deve analisar é a
situação econômica do doador. Não é outro o posicionamento de Caio Mario:
Não tendo a lei
instituído o critério estimativo, deixa sua fixação na decorrência das
circunstâncias, e em razão das posses do doador,17 pois é certo que um
mesmo objeto que para uma pessoa de elevados recursos representa valor reduzido,
para outra de pequena resistência econômica alcança as proporções do
inatingível.[29]
5.
Classificação da
Doação (Demais Características)
O contrato de doação pode ser
classificado como típico ou nominado, face a sua previsão contratual nos
artigos 538 e ss. do CC. É, acima de tudo, contrato gratuito que, como tal,
interpreta-se estritivamente. Também unilateral, porque gera obrigação somente
para o doador de transferir o domínio do bem doado e, finalmente, é contrato
formal, como regra deve ser celebrado por escrito ou, quando for o caso por
escritura pública.
Apesar das características apresentadas,
algumas delas apresentam algumas peculiaridades e outras são questionadas em
determinadas circunstâncias. Vamos abrir outros tópicos para explicar esta
ressarva.
5.1. Obrigação com Encargo e o caráter unilateral.
Para alguns autores (GAGLIANO; FILHO,
2012, p. 134 o ônus que se impõe ao donatário não tem o peso de uma
contraprestação. Ou seja, a imposição do encargo ou ônus não desqualifica o
caráter gratuito, pois a doação não passa a ostentar característica da
bilateralidade.
No mesmo sentido, Caio Mario (PEREIRA,
2014) afirma que o encargo (modus) é
uma restrição à liberalidade, mas não uma prestação, pois jamais pode assumir o
aspecto de contrapartida da liberalidade. No entanto, é uma obrigação que se
não for cumprida poderá acarretar a revogação, como se verá abaixo.
5.2.
Contrato Formal
Não acredito particularmente que a doação pode ser classificada como
contrato formal, pois a forma que ela vai assumir verbal, formal ou solena, vai
depender do objeto a ser doado. Aliás, quando se quer fazer uma liberalidade em
favor de alguém, principalmente de bens móveis, procura-se evitar a forma
escrita para não criar aquela sensação incômoda de formalidade.
6.
Extinção da Doação
A doação pode ser extinta por causas gerais, devido
à invalidação (declaração de nulidade ou anulação do ato) ou específicas, nas
hipóteses de revogação por ingratidão ou não cumprimento do encargo.
Dentro das causas gerais, portanto, temos a
invalidação que é um gênero do qual são espécies a declaração de nulidade ou a
anulação. Para relembrar, é nula a doação universal e a inoficiosa no que
exceder a parte disponível. Seria nula, também, uma doação celebrada por agente
absolutamente incapaz ou que tenha como objeto bem inalienável. Por outro lado,
são anuláveis as doações do cônjuge adúltero ao seu cúmplice ou aquela doação feita
pelo doador já insolvente ou por ela reduzido à insolvência (fraude contra
credores).
As causas específicas são a revogação por
ingratidão ou descumprimento do encargo, que passaremos a analisar em seguida.
6.2 Da Revogação da Doação (art. 555 a 564)
6.1. Revogação
a) Conceito e Efeitos
Revogação é forma de resilição unilateral de
extinção de um contrato por meio de pedido formulado por um dos contratantes em
virtude da quebra de confiança entre
eles. É reconhecido como um direito potestativo em favor do doador. Sendo assim, a revogação desfaz os efeitos da
doação e somente pode ser operada por ordem judicial.
A revogação é uma causa superveniente de resolução da propriedade que,
a princípio, é transferida ao adquirente de maneira perpétua, mas, pela
ocorrência de algumas circunstâncias que quebram a confiança depositada no
donatário pelo doador, a propriedade se resolve, podendo o doador reivindicar a
posse do bem, sem prejuízo do direito de
terceiros que eventualmente tenham adquirido o bem.
Atente-se para o disposto no artigo 1.360 que trata da propriedade
resolúvel por causa superveniente:
Art.
1.360. Se a propriedade se resolver por outra causa superveniente, o possuidor,
que a tiver adquirido por título anterior à sua resolução, será considerado
proprietário perfeito, restando à pessoa, em cujo benefício houve a resolução,
ação contra aquele cuja propriedade se resolveu para haver a própria coisa ou o
seu valor.
Para ilustrar: A doa um imóvel para B e este, um ano depois, o
transfere para C. No entanto, dois anos depois da doação, B cometeu ofensa
física contra A, dando ensejo à revogação por ingratidão (veremos as hipóteses
logo adiante). Neste caso, como prevê o art. 1.360, a propriedade de C torna-se
perfeita, restando ao doador A apenas cobrar o valor da coisa de B, vez que ela
se incorporou definitivamente no patrimônio de C.
Portanto, a revogação funciona como causa superveniente de resolução da
propriedade, cujos efeitos são ex nunc.
6.2. Espécies e Características
Existem dois tipos de revogação da doação: por ingratidão ou por
inexecução do encargo. Trata-se de direito potestativo e irrenunciável (art.
556[30]), embora possa não ser
exercido.
6.3. Revogação Por
Ingratidão do Donatário
6.3.1. Hipóteses
autorizadoras (art. 557)
Reputam-se ingratas certas condutas
atentatórias aos direitos da personalidade do doador, tais como a vida,
integridade física, psíquica e a honra.
O Código Civil elenca quatro
hipótese que ensejam a revogação por ingratidão, são elas:
è Se o donatário atentou contra a vida do
doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele.
è Se cometeu contra ele ofensa física.
è Se o injuriou gravemente ou o caluniou.
è
Se,
podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava
(desamparo quanto aos alimentos).
a) Rol
Taxativo ou Exemplificativo
A primeira pergunta que fica é se o rol é taxativo (numeros clausus) ou exemplificativo (numeros apertus). Basta pensar que a
difamação, o furto, o estelionato, estupro, por exemplo, não foram elencados
expressamente como causas de ingratidão.
No campo doutrinário foi aprovado o Enunciado
33 da I Jornada do CJF/STJ para dirimir essa dúvida:
33 - Art. 557: o novo Código Civil
estabeleceu um novo sistema para a revogação da doação por ingratidão, pois o
rol legal previsto no art. 557 deixou de ser taxativo, admitindo,
excepcionalmente, outras hipóteses.
Segundo Flávio Tartuce, o enunciado
consubstancia entendimento majoritário. Conclui-se, portanto, que qualquer
atentado à dignidade do doador por parte do donatário pode acarretar a
revogação da doação por ingratidão, cabendo análise caso a caso. Em suma, o rol
é exemplificativo (numerus apertus).
Este é ponto de vista de Pablo Stolze
Gagliano, segundo o qual: “Não há limites para a ingratidão humana. Assim
sendo, a perspectiva de caracterização das hipóteses de ingratidão como
violações da boa-fé objetiva pós-contratual faz com que reconheçamos que, ao
contrário do que estava assentado na vigência do Código Civil brasileiro de
1016, o novo rol não é mais taxativo, aceitando, em nome do princípio, outras
hipóteses, ainda que de forma excepcional.
No entanto, prefiro ficar com a posição
de Caio Mario que entende ser taxativo o rol previsto neste artigo, já que a
revogação tem caráter de uma pena e, como tal, “somente cabe nos exatos termos
da definição legal (Código Civil, arts. 557 e 558), não obstante o Código de
2002 ter substituído a expressão “só se pode revogar...” do de 1916 por “podem
ser revogadas...” (PEREIRA, 2014)
b) Crimes contra a Honra
As hipóteses elencam condutas
tipificadas penalmente cuja definição é dada por especialistas no direito
penal. A
calúnia é a mais grave de todos os crimes contra a honra [...] pode ser
conceituada como “imputação falsa de fato definido como crime” (GRECO, 2011, p. 334). Exemplo:
Tibúrcio acusa falsamente Jonas de haver roubado o seu carro, embora soubesse
de sua inocência) (GAGLIANO; FILHO, 2012, 182).
Por outro lado, a injúria, na sua
modalidade fundamental, é considerada o crime mais leve contra a honra (idem).
Aníbal Bruno, citado por Greco (2011, p. 334), conceitua injúria como a palavra
ou gesto ultrajante que ofende o sentimento de dignidade da vítima. Na injúria
não existe imputação de fatos, mas de atributos pejorativos da vítima.
Constitui agressão por meio de palavras de baixo calão.
Espécies de injúria:
è Injúria simples
(art. 140, caput) detenção, 1 a 6 meses
è Injúria real
(violência ou vias de fato) – 3 m a 1 ano.
è Injúria
preconceituosa
Por fim, na difamação o agente imputa à
vítima fatos (não criminosos), posto desabonadores de sua conduta. Por exemplo:
Fibri divulga que Beto pode ser encontrado diariamente em pontos de jogo do
bicho, casas de prostituição ou em determinados botecos, em vez de estar
trabalhando ou estudando. (GAGLIANO; FILHO, 2012, 182.
c) Prévia condenação Criminal
Um dos mais importantes princípios do
processo penal é o da presunção de inocência. O réu não pode ser considerado
culpado antes do trânsito em julgado da sentença pena condenatória. No entanto,
para a caracterização do ato de ingratidão, prevalece a independência entre as
esferas civil e penal, de modo que é possível o ajuizamento e prosseguimento
normal da ação de revogação da doação de modo independente da respectiva ação
penal.
d) Ofendido ou Vítima do Ato de Ingratidão
Também pode ocorrer a revogação por ingratidão
quando o ofendido for cônjuge, ascendente, descendente, ainda que adotivo, ou
irmão do doador (art. 558 do CC). Há proposta de alteração desse dispositivo
com o objetivo de incluir neste rol o companheiro, equiparado em parte ao
cônjuge pela Constituição Federal (PL 699/2011).
e) Jurisprudência
Um acórdão do TJDFT ilustra bem uma
situação específica de revogação da doação por ingratidão. O caso mostra que a
filha agrediu fisicamente o pai, desferindo-lhe um chute no rosto. Segue a
ementa do acórdão:
DOAÇÃO.
REVOGAÇÃO POR INGRATIDÃO. INJÚRIA GRAVE.
Caracteriza injúria, a autorizar a revogação da doação por ingratidão (C. Civil, art. 1.181, c/c o 1.183, III), desferir a donatária, sem motivo, chute no rosto do doador, seu pai que, velho e doente, o mínimo que deveria receber da filha -- a quem devotou carinho, a ponto de lhe doar o único imóvel de seu patrimônio -- era respeito. Apelo provido. (TJDFT, 5.209.399)
Caracteriza injúria, a autorizar a revogação da doação por ingratidão (C. Civil, art. 1.181, c/c o 1.183, III), desferir a donatária, sem motivo, chute no rosto do doador, seu pai que, velho e doente, o mínimo que deveria receber da filha -- a quem devotou carinho, a ponto de lhe doar o único imóvel de seu patrimônio -- era respeito. Apelo provido. (TJDFT, 5.209.399)
6.3.2. Ação Cabível e Prazo Decadencial
A ação revocatória da doação deve ser
proposta no prazo decadencial de 1 (um) ano, a contar de quando chegue ao
conhecimento do doador o fato que a autorizar, e de ter sido o donatário o seu
autor. (art. 559). Aplica-se a teoria da actio
nata, pois o prazo flui a partir da ciência da prática do ato de autoria do
donatário
6.3.3. Legitimidade
Afirma-se que a ação revogatória é de
natureza personalíssima, pois ela falece com o doador (o direito não se
transmite aos herdeiros do doador). (art. 560)
Assim, se a ação revogatória não tiver
sido proposta, falecendo o doador, nada se pode fazer. O mesmo pode ser dito se
o ato de ingratidão for praticado e em seguida ocorrer a morte do donatário sem
ter sido instaurada a ação revocatória. Neste caso, a revogação não prejudicará
os herdeiros do donatário (art. 560, segunda parte).
Agora, se o doador tiver proposto a
ação em vida e falecer no curso desta, os herdeiros do doador podem prosseguir na ação iniciada
pelo doador, continuando-a contra os herdeiros do donatário, se este falecer
depois de ajuizada a lide. (art. 560, terceira parte).
A única hipótese em que a legitimidade
ativa será dos herdeiros e não doador é no caso de homicídio consumado contra
este, isso por razões óbvias, já que ainda não há notícia de alguém que
ressuscitou, além de Jesus Cristo. (art. 561, primeira parte)
6.3.4. O Perdão no Leito de Morte
O Art. 561 cogita da possibilidade do
doador que foi vítima de homicídio perdoar o donatário pelo ato praticado,
situação esta que afastaria a legitimidade ativa dos herdeiros (art. 561, parte
final)
6.3.5. Efeitos da Revogação por Ingratidão
a) Direitos de Terceiros
Como já frisado anteriormente, os
efeitos da ação revocatória são ex nunc,
não atingindo direitos de terceiros que tenham adquirido a propriedade ou outro
direito real sobre a coisa antes da prática do ato de ingratidão. Isso porque o
ato de ingratidão implementa uma condição resolutiva que não estava prevista no
título aquisitivo do bem. Ou seja: se C compra imóvel de B que este recebeu em
doação de A, C não poderia imaginar que B posteriormente praticaria homicídio
doloso, por exemplo, contra A. Portanto, como a escritura de compra e venda de
B para C nem a certidão de matrícula imobiliária não mencionam a causa, C não
pode ser prejudicado. Portanto, a revogação não prejudicará direito de terceiros,
conforme art. 563 e 1.360 do Código Civil.
b) Frutos
Os efeitos da posse como regra variam
conforme o possuidor esteja ou não de boa fé. Em relação aos frutos, se o
possuidor estiver de boa fé, terá direito àqueles que foram percebidos até o
momento em que este “estado subjetivo” cessar, já que o possuidor de má fé
responde por todos os frutos colhidos e percebidos. (art. 1.214 e 1.216)
No caso da revogação por ingratidão, o
legislador estabeleceu um marco preciso no qual haverá a transmudação da boa fé
para a má fé. Este marco é a citação válida, nos termos do art. 563 do Código
Civil, pois até este momento o donatário, mesmo tendo praticado o ato de
ingratidão, não é obrigado a restituir os frutos percebidos. Assim, a ação
revogatória só produz efeito após a citação.
Portanto, atenção: o donatário pode ter
praticado o crime de homicídio, mas isso não faz com que não tenha o direito
aos frutos percebidos até o momento da citação válida.
Só a título de recordação, os frutos
podem ser classificados conforme estejam ou não aptos a serem colhidos. Neste
sentido, pode-se falar em frutos pendentes, que ainda não estão aptos à
colheita, frutos percebidos, que já foram colhidos, frutos percipiendos,
aqueles que, apesar de já estarem aptos à colheita, ainda não o foram, e frutos
estantes, que são aqueles que já foram colhidos e estão armazenados ou
depositados.
Há, ainda, outra classificação que leva
em conta a natureza dos frutos, que podem ser: i) naturais, que são produzidos
naturalmente pelo próprio bem principal; ii) industriais, que são provenientes
do bem principal, mas que requerer a atuação humana para a sua produção e iii)
frutos civis ou rendimentos, que são bens inerentes à coisa e são produzidos
por meio de negócios jurídicos (exemplo: juros e aluguéis)
Digo isso porque os frutos naturais e
os industriais reputam-se colhidos tão logo sejam separados do bem principal,
enquanto os frutos civis consideram-se colhidos diariamente (art. 1.215)[31]
c) Indenização
Postulado básico do direito das
obrigações é o de que, não sendo possível o cumprimento da obrigação
específica, esta se converte em perdas e danos. A revogação a doação segue a
mesma lógica, pois, não sendo possível a restituição em espécie (o imóvel x, o
cavalo y), o donatário terá de indenizar o doador pelo preço correspondente ao
meio termo do valor da prestação in
natura.
6.3.6. Espécies de Doação Não Revogáveis por Ingratidão
Apesar da gravidade de alguns atos
elencados pela lei, algumas espécies de doação não podem ser revogadas (art.
564). São elas:
I - as doações puramente remuneratórias;
II - as oneradas com encargo já cumprido;
III - as que se fizerem em cumprimento de
obrigação natural;
IV - as feitas para determinado casamento.
6.4. Revogação por Inexecução do Encargo
Nas doações modais, caso o donatário
não cumpra o encargo fixado, duas alternativas surgem: A primeira delas é a de
exigir o cumprimento da obrigação in
natura mediante a tutela específica das obrigações de dar, fazer ou não
fazer alguma coisa, prevista nos artigos 461, 461,§5º e 461-A do CPC.
6.4.1. Tutela Específica Das Obrigações In Natura
No pedido de tutela
específica, o juiz determinará a realização de medidas para que a obrigação
seja cumprida in natura, tais como
astreintes, busca e apreensão, imissão na posse etc. A conversão da obrigação em perdas e danos, que é exceção, só
ocorrerá em 2 casos:
1 – quando o
cumprimento da obrigação específica não for possível;
2 – se o doador optar
pelas perdas e danos.
Anote-se que os legitimados para se
exigir o cumprimento do encargo podem ser o próprio doador, um terceiro, quando
o encargo de alguma forma lhe beneficiar ou ao o Ministério Público, quando o
encargo for fixado em favor da coletividade.
Portanto, é importante separar algumas
questões importantes:
è O encargo pode ser
imposto em benefício do doador, de terceiro ou da coletividade.
è Em qualquer caso, o
doador tem legitimidade para exigir a execução, mas se o encargo for
estabelecido em favor de terceiro, a legitimidade será concorrente.
è Por fim, nos termos
do art. 553 e seu parágrafo único, o MP só tem legitimidade para exigir o
cumprimento do encargo depois da morte do doador, se este não tiver feito (art.
553, p. único)
è Ou seja: O MP não
continua a ação promovida pelo doador, pois neste caso há substituição
processual para o espólio.
6.4.2. Ação de Revogação da Doação Por Descumprimento do Encargo
6.4.2.1. Mora do Donatário
A mora do donatário pode ser
configurada de duas formas. De forma automática, no dia do vencimento, ou
mediante notificação.
a) Mora Ex Re
A primeira delas é a chamada mora ex re que verifica automaticamente a
partir do dia do vencimento da obrigação. Isto é, a mora das obrigações a termo
certo se constitui automaticamente no vencimento, dispensando qualquer ato por
parte do interessado para tanto, já que dies
interpellat pro homine. (art. 397). Isso ocorre quando foi fixada, no
contrato de doação, data certa para o cumprimento do encargo. Exemplo: alguém
recebe um terreno em doação para fins de construção de uma escola ate o final
de dezembro de 2015.
b)
Mora Ex Persona
Por outro lado, quando o contrato não
fixar data certa para o cumprimento do encargo, não tem como o donatário ficar
constituído em mora automaticamente. É preciso, pois, uma notificação prévia.
(art. 397, parágrafo único c/c 562, parte final).
Interessante notar é que a lei menciona
apenas a notificação judicial, mas entendo que uma notificação extrajudicial,
via cartório, tem o mesmo efeito. Aliás, a notificação extrajudicial é um
caminho para a desjudicialização.
Outra nota importante é a de que, com a
notificação, o doador deverá fixar um prazo razoável para o cumprimento do
encargo. Só depois, se o donatário permanecer inerte é que ele estará
constituído em mora.
6.4.2.2. Legitimados
A observação de Flávio Tartuce é
oportuna e vale registrá-la logo de início: “Aqui, é importante não confundir o
legitimado para a revogação, que é somente o doador, com os legitimados para
exigir a execução do encargo na doação, que podem ser o doador, o terceiro ou o
Ministério Público caso o encargo seja do interesse geral” (TARTUCE, 2014, p.
357)
Em reforço, seguem-se as palavras
eruditas de Caio Mario sobre a legitimidade ativa nas ações revocatórias:
Não permite a
qualquer, mesmo que tenha interesse imediato, promover a revogação, senão ao
próprio doador, que só ele tem a legitimatio ad causam respectiva. E não
é possível fazê-lo ex propria auctoritate,40 senão pela via
judicial. A ação somente pode ser iniciada contra o donatário, em pessoa. Se,
porém, qualquer das partes falecer após a propositura da ação (Código Civil,
art. 560), a ação poderá continuar com os herdeiros do doador contra o
donatário, ou com o primeiro contra os herdeiros do segundo, ou com os
sucessores de um contra os do outro. É, portanto, personalíssima em nosso
direito a faculdade de pedir a revogação, ao contrário de outros sistemas. A
possibilidade da revogação é tão significativa em nosso direito que o
legislador, em matéria processual, acrescentou a possibilidade de revogação da
doação pelo rito sumário, previsto no art. 275, II, letra “g”, do Código de
Processo Civil.[32]
6.4.2.3. Prazo da Ação Revocatória por Inexecução do Encargo
O código é omisso em relação ao prazo do
procedimento de revogação da doação por inexecução do encargo. Duas correntes
se dividem sobre o assunto:
a)
Prazo Anual de
Natureza Decadencial por Analogia do art. 559
Alguns autores, como Paulo Lôbo, Arnoldo
Wald e Tartuce, sustentam que o prazo é de natureza decadencial, pois o doador
tem o direito potestativo de exigir a revogação, sendo que a sentença terá
natureza constitutiva. Assim, defendem que o prazo é de 1 ano, por analogia do
art. 559 do CC.
b)
Prazo
Prescricional Geral (art. 205)
Já para o STJ, a sentença tem natureza
condenatória, por isso o prazo tem natureza prescricional. Assim, por falta de
previsão específica, aplica-se a regra geral – 20 anos, no CC/16 e 10 anos, no
CC/02 (art. 205). Os precedentes do STJ, que examinaram a questão em situações
regidas pelo CC/16, entenderam que o prazo era vintenário. Neste sentido, o AgRg no EDcl no AREsp 46650/PR: “3. A ação para tornar sem efeito
a doação por motivo de inexecução do encargo prescreve em vinte anos.
Precedentes.”
EXERCÍCIOS. CONTRATO DE DOAÇÃO.
QUESTÃO 1. Prova: VUNESP - 2013 -
TJ-RJ - Juiz
É correto afirmar que a doação feita a
nascituro
a) deve ser considerada nula tanto nos
casos de natimorto como nos casos de nascimento com deficiência mental.
b) deve ser considerada inexistente no
caso de natimorto e nula nos casos de nascimento com vida, ainda que haja
aceitação por seu representante legal.
c) é nula de pleno direito, já que a
personalidade civil começa apenas com o nascimento com vida, independentemente
de aceitação por seu representante legal.
d)
desde que seja aceita por seu representante legal, é válida, ficando, porém,
sujeita a condição, qual seja, o nascimento com vida.
Não se revogam por ingratidão:
a) as doações as oneradas com
encargo ainda não cumprido.
b) as doações puramente remuneratórias.
c) as doações que se fizerem em
cumprimento de obrigação legal.
d) as doações feitas para determinado
enlace conformador de sociedade de fato.
Sobre o contrato de doação, é
INCORRETO afirmar que:
a) o Código Civil admite a
doação feita ao nascituro, que deverá ser aceita pelo seu representante legal;
b) a dispensa de aceitação, na
hipótese de donatário absolutamente incapaz, só é admitida na doação pura, ou
seja, desprovida de encargos ou submetida à condição;
c) na doação mortis causa, admitida expressamente no Novo Código Civil,
o doador dispõe que seus efeitos só se produzirão após a sua morte, ressalvando
o direito de revogá-la ad nutum;
d) a doação verbal é
considerada válida pelo Código Civil, sendo necessário o preenchimento de dois
requisitos: versar sobre bens móveis de pequeno valor e lhe seguir incontinenti
a tradição;
e) a doação remuneratória é
aquela que se destina a recompensar serviços prestados, aferíveis
economicamente, mas que não traduzem dívidas exigíveis, impossibilitando a
revogação por ingratidão.
A doação feita de ascendente a
descendente constitui
a) doação com cláusula de
reversão.
b) simulação anulável.
c) negócio jurídico nulo.
d) adiantamento de legítima.
e) negócio jurídico
inexistente.
No caso da doação, marque a
alternativa correta.
a) Admite-se o aceite tácito da
doação pelo donatário, mesmo que a doação seja sujeita a encargo.
b) A doação verbal será válida
se, versando sobre bens móveis de qualquer valor, seguir- se incontinenti a
tradição.
c) E inválida a doação feita ao
nascituro, mesmo sendo aceita pelo seu representante legal.
d) É válida cláusula de
reversão dos bens doados em favor de terceiro, se o doador sobreviver ao
donatário.
e) O doador não é obrigado a
pagar juros moratórios, nem é sujeito às conseqüências do vício redibitório.
Assinale a alternativa correta.
a) O doador pode estipular que
os bens doados voltem ao seu patrimônio se sobreviver ao donatário,
prevalecendo tal estipulação em favor de terceiro.
b) É nula a doação com
estipulação de cláusula de reversão em favor do doador, se este sobreviver ao
donatário, por configurarse doação a retorno.
c) O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio
se sobreviver ao donatário, não prevalecendo tal estipulação em favor de
terceiro.
d) O doador poderá inserir
cláusula estipulando que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver
ao donatário, hipótese em que se terá doação sob condição suspensiva.
Ricardo, casado com Carla,
pretende proceder à doação pura e simples de bem imóvel de sua propriedade a
seu único filho, Rafael, de quatorze anos de idade.
Acerca dessa situação hipotética, assinale a opção correta.
a) A doação só será válida sem
a outorga uxória se o regime de casamento for o da separação de bens.
b) Mesmo que Ricardo não
demonstre os motivos da revogação, a doação poderá ser revogada antes de Rafael
completar dezoito anos de idade.
c) Se Rafael já tiver filhos
quando falecer, o bem não poderá retornar ao patrimônio de Ricardo.
d) O nascimento de outro filho do casal não tornará a doação ineficaz.
e) Aplica-se ao caso a
aceitação tácita do donatário para aperfeiçoamento da doação.
Marcelo, brasileiro, solteiro,
advogado, sem que tenha qualquer impedimento para doar a casa de campo de sua
livre propriedade, resolve fazê-lo, sem quaisquer ônus ou encargos, em
benefício de Marina, sua amiga, também absolutamente capaz. Todavia, no âmbito
do contrato de doação, Marcelo estipula cláusula de reversão por meio da qual o
bem doado deverá se destinar ao patrimônio de Rômulo, irmão de Marcelo, caso
Rômulo sobreviva à donatária. A respeito dessa situação, é correto afirmar que
a) diante de expressa previsão
legal, não prevalece a cláusula de reversão estipulada em favor de Rômulo.
b) no caso, em razão de o
contrato de doação, por ser gratuito, comportar interpretação extensiva, a
cláusula de reversão em favor de terceiro é válida.
c) a cláusula em exame não é
válida em razão da relação de parentesco entre o doador, Marcelo, e o terceiro
beneficiário, Rômulo.
d) diante de expressa previsão
legal, a cláusula de reversão pode ser estipulada em favor do próprio doador ou
de terceiro beneficiário por aquele designado, caso qualquer deles, nessa
ordem, sobreviva ao donatário.
Assinale a opção correta no que
se refere a doação e seus efeitos.
a) Com o advento do Código
Civil de 2002, a promessa de doação que seja ato de liberalidade passou a
encerrar manifestação de vontade válida e, portanto, exigível na via judicial.
b) A doação feita pelo pai a um
dos filhos, sem a anuência dos demais descendentes, configura negócio jurídico
anulável.
c) Serão válidas as doações promovidas, na constância do casamento, por
cônjuges que contraírem matrimônio pelo regime da separação legal de bens em
razão da idade superior à prevista na lei civil.
d) Não configura fraude à
execução, por falta do elemento subjetivo da má-fé, a doação de imóvel
penhorado aos filhos menores dos executados que os reduza à insolvência, mesmo
que a penhora não seja registrada.
e) São nulas as doações feitas
por homem casado à sua companheira, após a separação de fato de sua esposa.
Quanto à doação, é INCORRETO
afirmar que:
a) Feita em contemplação do
merecimento do donatário, não perde o caráter de liberalidade, como não o perde
a doação remuneratória, ou a gravada, no excedente ao valor dos serviços
remunerados ou ao encargo imposto.
b) Feita em contemplação de
casamento futuro com certa e determinada pessoa, quer pelos nubentes entre si,
quer por terceiro a um deles, a ambos, ou aos filhos que, de futuro, houverem
um do outro, não pode ser impugnada por falta de aceitação, e só ficará sem efeito
se o casamento não se realizar.
c) Feita ao nascituro, valerá,
sendo aceita pelo seu representante legal.
d) A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro,
não importa em adiantamento do que lhes cabe por herança.
Assinale a alternativa correta.
a) O silêncio do donatário
quanto à aceitação da doação pura faz presumir que a recusou.
b) A doação remuneratória perde o caráter de liberalidade, se não
exceder o valor do serviço prestado.
c) A doação de bem imóvel de
qualquer valor pode ser feita por instrumento particular.
d) A doação feita ao nascituro
dispensa a aceitação.
e) A doação em forma de subvenção
periódica ao beneficiado transmite-se aos herdeiros do donatário.
Sônia, maior e capaz, decide
doar, por instrumento particular, certa quantia em dinheiro em favor se seu
sobrinho, Fernando, maior e capaz, caso ele venha a se casar com Leila. Sônia
faz constar, ainda, cláusula de irrevogabilidade da doação por eventual
ingratidão de seu sobrinho. Fernando, por sua vez, aceita formalmente a doação
e, poucos meses depois, casa-se com Leila, conforme estipulado. No dia seguinte
ao casamento, ao procurar sua tia para receber a quantia estabelecida, Fernando
deflagra uma discussão com Sônia e lhe dirige grave ofensa física.
A respeito da situação narrada, é correto afirmar que Fernando
a) não deve receber a quantia
em dinheiro, tendo em vista que a doação é nula, pois deveria ter sido
realizada por escritura pública.
b) deve receber a quantia em
dinheiro, em razão de o instrumento de doação prever cláusula de
irrevogabilidade por eventual ingratidão.
c) não deve receber a quantia em dinheiro, pois dirigiu grave ofensa
física à sua tia Sônia.
d) deve receber a quantia em
dinheiro, em razão de ter se casado com Leila e independentemente de ter
dirigido grave ofensa física a Sônia.
è Verificar a resolução desta
questão
JOSÉ e MARIA doaram a sua única
filha, LÚCIA, todos os imóveis de sua propriedade, reservando para o casal o
usufruto dos bens. À época da doação, CARLOS, fruto de outro relacionamento de
JOSÉ, já havia sido concebido. CARLOS, quando contava com cinco anos,
representado por sua mãe, promoveu ação visando anular a doação efetivada por
JOSÉ e MARIA a sua irmã LÚCIA.
Assinale a alternativa correta:
a) deve ser considerada inoficiosa a doação de ¼ (um quarto) dos bens
imóveis.
b) a doação não é nula, pois
JOSÉ e MARIA ao instituírem o usufruto sobre os imóveis doados cumpriram a
determinação legal de preservar renda suficiente para a subsistência do casal.
c) a doação é juridicamente
inexistente.
d) a doação não é nula, pois os
doadores podiam dispor do patrimônio, com reserva do usufruto para si,
considerando que a doação ocorreu antes do nascimento de CARLOS.
e) é nula a doação da
totalidade dos imóveis de propriedade de JOSE e MARIA a filha LÚCIA, pois os
direitos do nascituro devem ser preservados.
[1] TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil -
Volume Único, 4ª edição. Método, 12/2013. VitalBook file. p.
[2] PEREIRA, Caio Mário Silva. Instituições de
Direito Civil - Vol. III - Contratos, 18ª edição. Forense, 03/2014.
VitalBook file.
[3] Art. 542. A doação feita ao
nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal.
[4] Art. 158. Os negócios de
transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já
insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão
ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos.
[5]
Art. 548.
É nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para
a subsistência do doador.
[6]
Art. 549.
Nula é também a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento
da liberalidade, poderia dispor em testamento.
[7]
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona; 2012, p. 142.
[8] Art. 1.845. São herdeiros
necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.
[9] O companheiro não foi incluído
expressamente no rol do art. 1.845, mas, por meio de uma interpretação conforme
à Constituição, histórica e sistemática, podemos incluir o companheiro nessa
classe, pois a própria Constituição reconhece direitos iguais a todas as
espécies de famílias, de modo que não faria sentido excluir o companheiro desta
classe e incluir somente o cônjuge.
[10]
Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno
direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.
[11] CIVIL. DOAÇÃO INOFICIOSA.
A AÇÃO ANULATORIA COM BASE NO ART. 1176 DO CPC PODE SER INTENTADA
MESMO EM VIDA DO DOADOR. RECURSO NÃO CONHECIDO. (REsp 7879/SP)
[12]
GONÇALVES, Carlos Roberto. 2010, p. 292
[13] Art. 169. O negócio jurídico
nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.
[14] Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para
pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado:
I - no caso de coação, do dia em que ela
cessar;
II - no de erro, dolo, fraude contra
credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio
jurídico;
III - no de atos de incapazes, do dia em
que cessar a incapacidade.
[15]
Art. 544. A doação de ascendentes a
descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe
por herança.
[16] Art.1.992. O herdeiro que
sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em seu
poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a
que os deva levar, ou que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre
eles lhe cabia.
[17] Art. 2.006. A dispensa da
colação pode ser outorgada pelo doador em testamento, ou no próprio título de
liberalidade.
[18] Art. 550. A doação do cônjuge
adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros
necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal.
[19] Art. 1.727. As relações não
eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato.
[20] Art. 1.571. A sociedade conjugal termina:
I - pela morte de um dos cônjuges;
II - pela nulidade ou anulação do
casamento;
III - pela separação judicial;
IV - pelo divórcio.
[21] Art. 545. A
doação em forma de subvenção periódica ao beneficiado extingue-se morrendo o
doador, salvo se este outra coisa dispuser, mas não poderá ultrapassar a vida
do donatário.
[22] Art. 554. A doação a entidade
futura caducará se, em dois anos, esta não estiver constituída regularmente.
[23]
Art. 546. A doação feita em contemplação de casamento futuro com certa e
determinada pessoa, quer pelos nubentes entre si, quer por terceiro a um deles,
a ambos, ou aos filhos que, de futuro, houverem um do outro, não pode ser
impugnada por falta de aceitação, e só ficará sem efeito se o casamento não se
realizar.
[24]
Art. 547.
O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se
sobreviver ao donatário.
Parágrafo único.
Não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro.
[25] Art. 551. Salvo declaração em contrário, a doação em
comum a mais de uma pessoa entende-se distribuída entre elas por igual.
Parágrafo único. Se os donatários, em tal
caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge
sobrevivo.
[26]
Art. 541. A doação far-se-á por escritura
pública ou instrumento particular.
Parágrafo único. A doação verbal será
válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir
incontinenti a tradição.
[27] Art. 155 - Subtrair, para si ou
para outrem, coisa alheia móvel:
[...]
§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno
valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de
detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.
[28] HC 286680/RJ.
[29] PEREIRA, Caio Mário
Silva. Instituições de Direito Civil - Vol. III - Contratos, 18ª edição.
Forense, 03/2014. VitalBook file.
[30] Art. 556. Não se pode renunciar
antecipadamente o direito de revogar a liberalidade por ingratidão do
donatário.
[31] Art. 1.215. Os frutos naturais e
industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são separados; os civis
reputam-se percebidos dia por dia.
to Civil - Vol. III - Contratos, 18ª
edição. Forense, 03/2014. VitalBook file.
Minha mãe fez doação de 25% de sua parte para minha irmã, alguns anos atrás. Minha irmã morava com ela. Tive que retirar a minha mãe da minha irmã por maus tratos. Tenho inclusive, vídeos e testemunhas. Gostaria de saber, se ao falecimento da minha mãe, posso contestar. Obrigada
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