TROCA OU PERMUTA (533 + C/V)
1. Conceito
Após a advento da moeda a troca perdeu
muito da sua importância, eis que o dinheiro proporcionou mais a) comodidade; b
) segurança e c) simplicidade nas transações. A importância é tão reduzida que
algumas legislações, como a portuguesa, não lhe reserva tratamento específico
(CHAVES; ROSENVALD, 2011)
É
negócio pelo qual as partes se obrigam a entregar reciprocamente coisas, que
não sejam dinheiro. Tem termos bem simples, a troca é uma compra e venda que se
paga com bens, e não com dinheiro.
Ou
ainda:
“É o contrato
pelo qual as partes se obrigam a transferir, uma para a outra, o domínio de um
bem, com ou sem complemento em dinheiro. (PAULO NADER)”
“É o contrato
pelo qual uma das partes se obrigam a dar uma coisa por outra (BEVILACQUA apud
GONÇALVES, 2012, p. 271)”
“É aquele pelo
qual as partes se obrigam a dar uma coisa por outra que não seja dinheiro
(TARTUCE, 2011, p. 319)”
A
troca é um dos negócios mais antigos da civilização. Sua presença ainda é
sentida em nossos dias nas ocasiões mais simples, em que crianças trocam
figurinhas para completar um álbum.
2. Regência Normativa
O
Código Civil reserva apenas um artigo para tratar da troca, o art. 533. Salvo
esta regra, que traz algumas peculiaridades, aplica-se supletivamente à troca
tudo o que disser respeito à compra e venda, feitas as devidas adaptações.
3. Características.
Para
não ser repetitivo, apenas enunciarei as características sem preocupar em
justificar, pois já cuidei disso na teoria geral dos contratos. Assim, a troca
é um contrato típico, bilateral, oneroso, comutativo, mas podendo assumir a
forma aleatória, não solene, salvo a hipótese do artigo 108 do CC, consensual,
mas de efeitos obrigacionais, impessoal, dentre outras classificações possíveis.
Em
relação às características, tudo o que foi dito sobre a compra e venda pode ser
aproveitado, notadamente a garantia da evicção e dos vícios redibitórios, a
exceção do contrato não cumprido etc.
Quanto
aos vícios redibitórios só há uma diferença. É que, constatado o defeito oculto
no objeto adquirido abrem-se duas possibilidades ao comprador: i) Ação
redibitória (resolução do contrato) ii) Abatimento proporcional do preço
(quanti minoris). Na troca, o permutante não pode se valer da ação quanti minoris,
pois o preço não é elemento do contrato
Outra
diferença importante que deve ser ressaltada refere-se à natureza obrigacional
dos contratos.
Na
compra e venda, como se viu, o contrato se aperfeiçoa (forma-se) no momento em
que as partes estão de acordo com a coisa e o preço. Trata-se, assim, de um
contrato consensual, pois o vínculo obrigacional surge a partir do
consentimento. No entanto, a assinatura do contrato não implica na transmissão
do direito de propriedade que depende da tradição ou do registro, em se
tratando de bens móveis ou imóveis, respectivamente.
A
troca segue o mesmo raciocínio. É também contrato consensual de efeitos
obrigacionais, por exigir a tradição ou o registro, conforme o caso.
No
entanto, uma diferença importante há entre os dois contratos. Em uma compra e
venda pura, se o vendedor entregar o bem móvel ao comprador mesmo sem receber o
preço, lhe transmitirá a propriedade pela tradição. E se porventura o comprador não pagar o preço,
o vendedor deverá propor ação de cobrança para receber o valor.
Na
troca isso não acontece. Segundo Flávio Tartuce, se um dos permutantes entregar
a coisa e o outro não, o que entregou pode exigir a restituição da coisa.
Assim, pelo que eu entendi, a transferência da propriedade só ocorre com a tradição
de ambos os bens. Do contrário, se um dos permutantes não cumpriu sua
prestação, mas recebeu o bem da outra parte, não pode ser havido como
proprietário ainda.
Será
que isso procede? E se um dos contratantes registrar o imóvel entregue pelo
outro permutante? O registro o constitui como o proprietário... Poderia o outro
permutante desconstituir o registro?
4. Permuta com Torna
As prestações
das partes no contrato de troca são coisas, mas não exclusivamente coisas. É
que se admite que a prestação seja composta por uma coisa e um saldo, ou torna,
como preferem alguns, em dinheiro. Por exemplo: A transfere a B uma casa e
este, em troca, transfere a B um apartamento, mais um saldo em pecúnia.
O difícil em
tais situações é saber quando se tem uma compra e venda com o preço composto
por dinheiro e parte em coisa ou quando se tem uma permuta com torna ou saldo.
Diversos autores
sugerem critérios distintos para definir se será caso de troca ou compra e
venda. Dentre eles, há o critério objetivo segundo o qual o contrato será o de
troca se, na prestação da parte, o valor da coisa for superior à quantia em
dinheiro.[1]
Por outro lado, alguns sugerem um critério subjetivo e casuístico para definir
uma e outra, que depende da análise da intenção das partes e da situação
concreta[2].
Entre nós, Carlos Roberto Gonçalves filia-se ao critério objetivo, com o qual se concorda. Então, se “B” recebeu de “A” um bem no valor de R$ 100,00, e der, em troca, outra coisa no valor de R$ 30,00, mais R$ 70,00 em dinheiro, haverá compra e venda. Aliás, haverá compra e venda se o valor pago em pecúnia for superior à metade do valor da prestação.
5. Regras Especiais da Troca
Como visto, o
art. 533 apresenta duas regras especiais e peculiares. A primeira delas trata
da divisão da responsabilidade pelo custeio das despesas das coisas antes da
tradição. Assim, enuncia o 533, I:
Art. 533. Aplicam-se à troca as
disposições referentes à compra e venda, com as seguintes modificações:
I - salvo disposição em contrário, cada um
dos contratantes pagará por metade as despesas com o instrumento da troca;
Assim,
diferentemente da compra e venda, na qual cabe ao comprador o ônus de arcar com
as despesas do registro, na troca o legislador fixa um rateio proporcional
entre os permutantes. Essa regra, no entanto, é dispositiva, podendo as partes
estabelecer de forma contrária.
A segunda regra
especial é quanto à troca de bens entre ascendentes e descendentes, enunciada
no inciso II, vejamos:
II - é anulável
a troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes, sem
consentimento dos outros descendentes e do cônjuge do alienante.
A lógica é mesma
da compra e venda: proteger a legítima dos herdeiros necessários. Mas atenção
porque nem toda troca depende de autorização, mas só aquela de bens com valores
desiguais. Para ser mais exato, a autorização somente é exigida se o valor do
bem transmitido pelo ascendente for superior ao valor do bem do descendente. Se
os bens forem de valores iguais ou o bem do descendente for superior, em nada
prejudica a legítima e, consequentemente, não será necessária a autorização.
Ainda quanto
esta hipótese do inciso II do art. 533, aplicam-se as demais disposições da
compra e venda. Atentar-se, pois, ao que foi dito sobre a venda de ascendente
para a descendente no capítulo da compra e venda.
[1] Para Silvio de
Salvo Venosa, é preciso verificar qual é o valor preponderante (VENOSA, 2012,
p. 90). “Necessário, porém, que a coisa seja o objeto predominante do
contrato”. O problema é que o autor não apresenta parâmetros objetivos para
dizer o que seria essa preponderância. Com esse posicionamento também estão
Marcos Aurélio Bezzera de Melo e Silvio Rodrigues (CHAVES; ROSENVALD, 2012, p.
758)
[2] Para saber se
foi compra e venda ou troca, deve-se analisar a intenção das partes, pois se o
objetivo for a “aquisição de um bem”, o negócio será uma compra e venda e não
troca. Nelson Rosenvald.
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