quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

TROCA OU PERMUTA



TROCA OU PERMUTA (533 + C/V)
1.       Conceito

Após a advento da moeda a troca perdeu muito da sua importância, eis que o dinheiro proporcionou mais a) comodidade; b ) segurança e c) simplicidade nas transações. A importância é tão reduzida que algumas legislações, como a portuguesa, não lhe reserva tratamento específico (CHAVES; ROSENVALD, 2011)
É negócio pelo qual as partes se obrigam a entregar reciprocamente coisas, que não sejam dinheiro. Tem termos bem simples, a troca é uma compra e venda que se paga com bens, e não com dinheiro.

Ou ainda:

“É o contrato pelo qual as partes se obrigam a transferir, uma para a outra, o domínio de um bem, com ou sem complemento em dinheiro. (PAULO NADER)”
“É o contrato pelo qual uma das partes se obrigam a dar uma coisa por outra (BEVILACQUA apud GONÇALVES, 2012, p. 271)”
“É aquele pelo qual as partes se obrigam a dar uma coisa por outra que não seja dinheiro (TARTUCE, 2011, p. 319)”

A troca é um dos negócios mais antigos da civilização. Sua presença ainda é sentida em nossos dias nas ocasiões mais simples, em que crianças trocam figurinhas para completar um álbum.

2.       Regência Normativa

O Código Civil reserva apenas um artigo para tratar da troca, o art. 533. Salvo esta regra, que traz algumas peculiaridades, aplica-se supletivamente à troca tudo o que disser respeito à compra e venda, feitas as devidas adaptações.

3.       Características.

Para não ser repetitivo, apenas enunciarei as características sem preocupar em justificar, pois já cuidei disso na teoria geral dos contratos. Assim, a troca é um contrato típico, bilateral, oneroso, comutativo, mas podendo assumir a forma aleatória, não solene, salvo a hipótese do artigo 108 do CC, consensual, mas de efeitos obrigacionais, impessoal, dentre outras classificações possíveis.

Em relação às características, tudo o que foi dito sobre a compra e venda pode ser aproveitado, notadamente a garantia da evicção e dos vícios redibitórios, a exceção do contrato não cumprido etc.

Quanto aos vícios redibitórios só há uma diferença. É que, constatado o defeito oculto no objeto adquirido abrem-se duas possibilidades ao comprador: i) Ação redibitória (resolução do contrato) ii) Abatimento proporcional do preço (quanti minoris). Na troca, o permutante não pode se valer da ação quanti minoris, pois o preço não é elemento do contrato

Outra diferença importante que deve ser ressaltada refere-se à natureza obrigacional dos contratos.
Na compra e venda, como se viu, o contrato se aperfeiçoa (forma-se) no momento em que as partes estão de acordo com a coisa e o preço. Trata-se, assim, de um contrato consensual, pois o vínculo obrigacional surge a partir do consentimento. No entanto, a assinatura do contrato não implica na transmissão do direito de propriedade que depende da tradição ou do registro, em se tratando de bens móveis ou imóveis, respectivamente.

A troca segue o mesmo raciocínio. É também contrato consensual de efeitos obrigacionais, por exigir a tradição ou o registro, conforme o caso.

No entanto, uma diferença importante há entre os dois contratos. Em uma compra e venda pura, se o vendedor entregar o bem móvel ao comprador mesmo sem receber o preço, lhe transmitirá a propriedade pela tradição. E  se porventura o comprador não pagar o preço, o vendedor deverá propor ação de cobrança para receber o valor.

Na troca isso não acontece. Segundo Flávio Tartuce, se um dos permutantes entregar a coisa e o outro não, o que entregou pode exigir a restituição da coisa. Assim, pelo que eu entendi, a transferência da propriedade só ocorre com a tradição de ambos os bens. Do contrário, se um dos permutantes não cumpriu sua prestação, mas recebeu o bem da outra parte, não pode ser havido como proprietário ainda.

Será que isso procede? E se um dos contratantes registrar o imóvel entregue pelo outro permutante? O registro o constitui como o proprietário... Poderia o outro permutante desconstituir o registro?

4.       Permuta com Torna

As prestações das partes no contrato de troca são coisas, mas não exclusivamente coisas. É que se admite que a prestação seja composta por uma coisa e um saldo, ou torna, como preferem alguns, em dinheiro. Por exemplo: A transfere a B uma casa e este, em troca, transfere a B um apartamento, mais um saldo em pecúnia.

O difícil em tais situações é saber quando se tem uma compra e venda com o preço composto por dinheiro e parte em coisa ou quando se tem uma permuta com torna ou saldo.

Diversos autores sugerem critérios distintos para definir se será caso de troca ou compra e venda. Dentre eles, há o critério objetivo segundo o qual o contrato será o de troca se, na prestação da parte, o valor da coisa for superior à quantia em dinheiro.[1] Por outro lado, alguns sugerem um critério subjetivo e casuístico para definir uma e outra, que depende da análise da intenção das partes e da situação concreta[2].

Entre nós, Carlos Roberto Gonçalves filia-se ao critério objetivo, com o qual se concorda. Então, se “B” recebeu de “A” um bem no valor de R$ 100,00, e der, em troca, outra coisa no valor de R$ 30,00, mais R$ 70,00 em dinheiro, haverá compra e venda. Aliás, haverá compra e venda se o valor pago em pecúnia for superior à metade do valor da prestação.

5.       Regras Especiais da Troca

Como visto, o art. 533 apresenta duas regras especiais e peculiares. A primeira delas trata da divisão da responsabilidade pelo custeio das despesas das coisas antes da tradição. Assim, enuncia o 533, I:

Art. 533. Aplicam-se à troca as disposições referentes à compra e venda, com as seguintes modificações:

I - salvo disposição em contrário, cada um dos contratantes pagará por metade as despesas com o instrumento da troca;

Assim, diferentemente da compra e venda, na qual cabe ao comprador o ônus de arcar com as despesas do registro, na troca o legislador fixa um rateio proporcional entre os permutantes. Essa regra, no entanto, é dispositiva, podendo as partes estabelecer de forma contrária.

A segunda regra especial é quanto à troca de bens entre ascendentes e descendentes, enunciada no inciso II, vejamos:

II - é anulável a troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes, sem consentimento dos outros descendentes e do cônjuge do alienante.

A lógica é mesma da compra e venda: proteger a legítima dos herdeiros necessários. Mas atenção porque nem toda troca depende de autorização, mas só aquela de bens com valores desiguais. Para ser mais exato, a autorização somente é exigida se o valor do bem transmitido pelo ascendente for superior ao valor do bem do descendente. Se os bens forem de valores iguais ou o bem do descendente for superior, em nada prejudica a legítima e, consequentemente, não será necessária a autorização.

Ainda quanto esta hipótese do inciso II do art. 533, aplicam-se as demais disposições da compra e venda. Atentar-se, pois, ao que foi dito sobre a venda de ascendente para a descendente no capítulo da compra e venda.
























[1] Para Silvio de Salvo Venosa, é preciso verificar qual é o valor preponderante (VENOSA, 2012, p. 90). “Necessário, porém, que a coisa seja o objeto predominante do contrato”. O problema é que o autor não apresenta parâmetros objetivos para dizer o que seria essa preponderância. Com esse posicionamento também estão Marcos Aurélio Bezzera de Melo e Silvio Rodrigues (CHAVES; ROSENVALD, 2012, p. 758)
[2] Para saber se foi compra e venda ou troca, deve-se analisar a intenção das partes, pois se o objetivo for a “aquisição de um bem”, o negócio será uma compra e venda e não troca. Nelson Rosenvald.

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